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Importância do ensino do braille na reabilitação de cegos adultos

por Lerparaver

Por Teresa Maia

Afirmar que o braille é um símbolo de identificação com a cegueira, é um lugar comum para quantos lidam de perto com estas questões, mas pode ter algum significado para aqueles (e são-no cada vez em maior número) que há pouco tempo se vêm introduzindo nestes assuntos.

Só lê braille quem não vê, quem é forçado por razões determinantes a fazê-lo quando já se esgotaram todas as hipóteses, ainda que ténues, de alternativas aos resíduos visuais.

Sempre que um adulto, portador de cegueira recente, se disponibiliza para aprender o Sistema Braille é porque já assumiu a sua nova condição de deficiente visual. Esta é a primordial de todo um conjunto de muitas outras que se lhe seguem e que estão subjacentes a esta atitude perante a sua nova vida de indivíduo privado de vista. É, talvez nesta acepção que a palavra "reabilitação" tem o seu maior significado. "Reabilitar" é "voltar a preparar a vida". Alguém que viu durante um período mais ou menos longo da sua existência e em dado momento fica privado desse sentido é um ser humano que ficou com a sua vida cortada em duas partes: uma antes e a outra depois de ter ficado cego. Tal como afirmou um estudioso americano das questões da cegueira, ela, a cegueira, é um acontecimento de tal modo grave na vida de uma pessoa, susceptível de "desestruturar" a personalidade.

Decidir aprender o Sistema Braille é, pois, uma decisão séria e profundamente construtiva para "reestruturar" e retomar o gosto, o interesse, o prazer pela vida, pelos afectos, pelas emoções, pela realização pessoal e profissional.

Um adulto que aprende braille em processo de reabilitação é, obviamente, um cidadão alfabetizado e, não raro, portador de um grau de cultura e instrução académicas elevados, não vai portanto aprender a ler nem a escrever, mas, tão somente, vai aprender a ler e escrever por um novo processo baseado num outro sentido, o do tacto.

É assim que o professor de braille deve ter o máximo cuidado em apresentar ao aluno textos que não infantilizem nem banalizem os saberes de que ele é detentor.

Esta é uma excelente ocasião para começar a dar informações relacionadas com diversos assuntos que tenham a ver com a problemática da cegueira, tais como: utilização de ceco gramas, endereços de bibliotecas e outros serviços vocacionados para o atendimento de deficientes visuais, história do associativismo, legislação, etc.

O sentido do tacto é, pois o pilar sobre que assenta toda a aprendizagem do Sistema Braille. Geralmente, estes alunos apresentam dificuldades tácteis iniciais e tendem a fazer analogias com a escrita a tinta, nomeadamente quanto ao feitio das letras e às posições dos pontos que compõem a "célula braille".

Nunca é demais repetir que um bom domínio do Sistema Braille passa por um bom desenvolvimento táctil. A fase de pré-leitura é muito importante para o futuro da aquisição do sistema. De início o aluno deve identificar relevos, pontos, grupos de pontos mais ou menos compactos, com diferentes graus de continuidade e descontinuidade. Só depois de bem explorados estes aspectos se deve passar à fase da leitura propriamente dita.

A nossa experiência diz-nos que os alunos adultos manifestam uma grande ansiedade na fase de pré-leitura, pois sentem que não estão a "aprender" consoante é seu legítimo desejo. Deve aqui o professor explicar-lhes a situação com bastante pormenor e repeti-la quantas vezes forem necessárias, pois é perfeitamente compreensível o estado de ansiedade e até de insegurança que o aluno experimenta.

A aquisição da técnica de leitura é o passo mais árduo e moroso que o aluno tem de dar; pelo contrário, a técnica da escrita é mais simples e fácil; é por isto que a escrita só é iniciada quando o aluno já domina razoavelmente a leitura.

Outro aspecto importante é a postura corporal. O aluno deve ser encorajado a desenvolver uma correcta posição do seu corpo e enquadrá-lo devidamente com a mesa de trabalho e os materiais: fichas, livro, máquinas braille, pautas, etc.

Por fim vamos aqui deixar uma nota que já em diversas ocasiões aflorámos; é a total ausência de material didáctico editado para este trabalho de iniciação ao Sistema Braille de adultos alfabetizados. Faltam igualmente, estudos adaptados à língua portuguesa para iniciação à leitura e escrita braille, de crianças em idade escolar.

O Sistema Braille não é gratificante, análogo da escrita vulgar. Recorre a um sentido, o tacto, que também não é análogo do sentido da vista, pois enquanto este é globalizante, o tacto é analítico... Estas diferenças têm de ser respeitadas...

CONCLUSÃO

A reabilitação dos cegos adultos é um processo global e total. O ensino do Sistema Braille é apenas um dos elementos que compõem essa totalidade. Ensinar o Sistema Braille a um adulto que cegou recentemente não é uma mera transmissão de conhecimentos técnicos, conteúdos pedagógicos. Nesta condição, o professor de braille tem de ter disponibilidade para ouvir e falar sobre a cegueira, de atitudes e de defesas, medos e angústias que o aluno manifesta perante ela.

A reabilitação não é um mero processo com tempo e horário marcados. É antes uma mudança de atitude face à vida, sem o sentido da vista, que implica coragem, determinação, consciência de que se é diferente do que se era dantes. Mas, simultaneamente, a reabilitação dá a consciência de que a vida não termina porque a vista terminou. Que Ela, a Vida, continua a ter sentido, valor e espaço de afirmação pessoal.

Ensinar braille a um adulto que cegou recentemente é, em suma, ajudar alguém a dar o salto da profunda depressão e descrença para uma nova postura em que o braille é um dos muitos instrumentos de acção positiva no futuro.

Comentários

Olá, este artigo é muito útil e sempre atual.
gostei muito.

Apesar de eu utilizar mais o computador, considero o Braille de fundamental importância afinal foi com ele que me alfabetizei e iniciei minha vida ativa.

Além do mais quando eu quero melhorar minha ortografia, é ao Braille que recorro porque no computador esta tarefa torna-se um pouco complicada ao meu ver.

Pena que os professores de braille de hoje já não sejam como antigamente. Quero dizer com isto que a maioria dos docentes que ensinam o braille hoje em dia já não têm aquela técnica apurada de aprendizagem deste sistema, embora compreenda que tal se deve, como nos diz este artigo, a falta de material didáctico que ajude o formando a motivar-se para aprender este sistema.

Sei, por ter ajudado algumas pessoas na leitura e escrita braille, que quem tem cegueira tardia tem mais dificuldades na aprendizagem do mesmo, mas também sei que pellos motivos descritos acima este sistema hoje em dia é cada vez menos usado por esse tipo de pessoas, que preferem antes o computador.

Tiago Duarte

Tiago Duarte

Olá
Eu li este artigo e achei estremamente interessante. Recentemente tive que começar a lidar no dia a dia com a cegueira da minha mãe que tem 58 anos. Sempre foi uma mulher muito activa e independente e de repente vê-se dependente de terceiros. Apesar de tudo em casa é bastante autónoma não fazendo apenas a sua comida mesmo porque aqui em casa temos medo que ela se queime. O que me espanta é ela não querer aprender novas "técnicas" para poder fazer melhor a sua vida. Não quer um cão guia, não quer uma bengala nem quer aprender Braille. Esta última espantou-me porque um dos seus passatempos favoritos era ler. Acho que ela apesar de mostrar que já aceitou a sua condição "por dentro" ainda não o fez. A minha maior dificuldade de momento é não saber onde existem "escolas" para este tipo de situação. Gostava que ela tivesse ocupada durante o dia a "aprender a ser cega". Alguém me pode ajudar com isto?
Desde já o meu obrigado

Olá Vera.

Não sei onde reside, mas de qualquer modo, se é em Portugal, e tendo em conta a situação da sua mãe, tem pelo menos dois centros de reabilitação que correspondem ao que pretende. São eles centro Nossa senhora dos Anjos, em Lisboa, e Centro de Reabilitação da Areosa, no Porto.

Se pretender mais informações, pode sempre contactar comigo, pois no que puder ajudar, estou à disposição.
e-mail/msn:
tiagoduarte.pt@gmail.com

Cumprimentos,

Tiago Duarte

Tiago Duarte

Oi Tiago,
Estava aqui procurando alguns artigos sobre cegueira e sobre braille e li tua resposta para a vera. Estou fazendo um curso de capaditação para trabalhar com pessoas cegas. Já aprendi um pouco do braille e agora preciso ensinar o braille para uma pessoa adulta que cegou a pouco tempo. Quql a melhor forma para começar?
Obrigada!
Elaine - elainess2@ig.com.br

olá meu amigo, quero lhe dizer que tenho 49 anos e que ceguei há pouco tempo, acontece que a sua mãe pode fazer a reabilitação no centro de reablitação nossa senhora dos anjos em lisboa. Ali ela aprende tudo o que na realidade ela fazia com as mãos e os olhos aver, só que agora ela vai aprender tudo mas sem os olhos a ver, até fazer comida no fogão, pregar um botão, fazer uma bainha nas calças, pregar um feicho em qualquer tipo de roupa, utilizar o computador para poder ler livros em audio ou em mp3 etc etc etc se vocequizer mais alguma informação pode me enviar um mail que eu lheexplico tudo pessoalmente: ruy.alberto@sapo.pt

Olá Vera!
Os centros de reabilitação são sempre boas soluções, nomeadamente para quem acabou de cegar e precisa aprender uma série de estratégias/ soluções/ conhecimentos para se adaptar, mas se a sua mãe não está a aceitar bem a situação e as vossas sugestões, poderá pensar nos serviços de reabilitação locais da ACAPO (gratuitos): neste caso, o apoio até pode ser dado em vossa casa (sem necessidade de se expor nesta fase) - para começar, penso que umas conversas com um psicólogo podiam ajudar... A adaptação dos familiares também pode ser facilitada, porque muitas vezes os “medos” pessoais dos familiares também não ajudam à recuperação da pessoa, que se vai sentir incapaz/inútil para realizar as tarefas mais simples…
Como não sei a sua área de residência também não sei se é abrangida por alguma Delegação da ACAPO nem quais os apoios disponíveis (são variáveis de delegação para delegação e abrangem um ou mais dos seguintes apoios: Social, Psicológico, Orientação e Mobilidade, Terapia Ocupacional, Braille e Novas Tecnologias, Formação Profissional, para além da organização de actividades para grupos em várias áreas). De qualquer forma, poderá encontrar os contactos das delegações existentes no País neste endereço: http://www.acapo.pt/delegations.asp - e mesmo que os apoios locais sejam insuficientes, uma conversa com os técnicos existentes poderá sempre esclarecer-vos algumas dúvidas e facilitar a aceitação da ideia de ir para um Centro de Reabilitação...
Boa sorte e muita força!

Tenho visto varios comentarios sobre Braille,acho que como adulto ,o uso do computador e mais pratico e agradavel,ja que posso baixar livros e revistas ,fazer pesquisas,etc...

No entanto ele me parece necessario ,para se fazer concursos publicos,ou para leituras de contas e outros documentos.

Tendo em vista que este site e visto por cegos e nao cegos, tesovi pedir a ajuda de quem conhece o assunto.
Moro no su. deMinas Gerais, proximo das cidades, Pouso Alegre, Sao Jose dos campos e Taubate.
Gostaria de saber alguns endereços em qualquer destas cidades onde eu poderia comprar uma bengala.
Toda ajuda sera bem vinda, desde ja muito obrigada.

Olá Shirley!

Pesquise na Net, penso que encontrará lá algumas respostas! Ou então ligue para a associação de cegos da sua zona...tenho a certeza que a vão ajudar!

Beijos, Céu!

A bengala você pode comprar no laramara. Digite este nome no google que você encontrará! De que cidade você é? Sou de São Lourenço e tenho postado aqui sobre o evento cinema nacional audiodescrito e legendado. Você tem acompanhado meus posts? Para nos conhecermos melhor, peço que envie um e-mail para diego8759@yahoo.com.br! Venha assistir conosco!

Ola Diego, muito obrigada pela dica dada, tenho certeza de encontrar em llaramara o que estou procurando.
sou de Heliodora, mas moro em Sapucai Mirim.
Em breve entrarei em contato com você através do seu email.Abraços.

Aguardo seu contato sim Shirlei. Aproveitando a oportunidade, sinta-se convidada para a segunda exibição do cinema audiodescrito em São Lourenço! Será dia 21 de maio! Tirarei suas dúvidas por e-mail e a gente combina!

gostaria de saber como proceder para fazer o curso de braille, pois o oftalmologista diagnosticou em mim uma doenca sem cura, (degeneracao coreorretiniana); devido ao tempo de evolucao (10 anos)ja perdi 80% da esquerda, e ja afetou tambem a direita, nao sou 100% cega ,mas tenho 45 anos e o medico diz que a doenca se evolui ainda mais rapido devido a idade podendo assim chegar a cegueira . o mesmo ja relatou em laudo medico que devo fazer o curso de barille. obrigado, valeria