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Filho de Cego sabe Braillar - blog de aquilino

Primeiro contacto com o Braillenote Apex

por aquilino

Depois de uma longa espera que parecia não ter fim (na verdade foi só uma semana), recebi o meu Braillenote Apex. A expectativa era grande. Afinal, trata-se do sucessor de uma máquina muito marcante. Goste-se ou não dele (e o Braillenote é uma daquelas máquinas do tipo amar-ou-odiar), a verdade é que ele é uma referência nas tecnologias de apoio.

o Apex é a terceira geração do Braillenote, mas a segunda nem sequer chegou a Portugal. Todos os Braillenotes que ainda estão a ser utilizados são da primeira geração, quando não havia sequer portas USB, quanto mais redes sem fios... isto ajuda a perceber a emoção de ter nas minhas mãos o sucessor de um aparelho que faz parte dos meus últimos dez anos de vida. O Braillenote é um visitante assíduo da oficina da Electrosertec, a mor das vezes por causa da linha braille. Alguns felizes proprietários nunca tiveram um problema técnico, para maior desespero dos infelizes donos de Braillenotes que repetidamente ficam sem braille.

As minhas mãos tremiam ao abrir a bonita embalagem do Apex, do tamanho aproximado de uma caixa de um PC portátil. Ainda está fresca na minha mente a desilusão da nova máquina Perkins. Cinquenta e oito anos depois, conseguiram fazer uma máquina com todos os argumentos para ser melhor que a pesada, feia e barulhenta Perkins. Mais leve, mais silenciosa, mais suave... e mais frágil. A nova Perkins não passa o teste de uma utilização frequente e intensa. Mas sejamos optimistas, o Apex será certamente diferente.

Lá dentro da caixa, tudo bem arrumadinho e protegido pelo enchimento de espuma sintética. Primeiro os manuais: são dois, a tinta: o guia de iniciação rápida e o manual de comandos. Por baixo, envolvido numa bolsa de pele (ou de uma imitação muito convincente), lá estava ele. A bolsa, só por si, é um produto. Muito macia ao toque, acolchoada, com um pequeno bolso com fecho de correr para guardar papéis ou pequenos objectos. Dos lados, pequenas aberturas presas com velcro escondem o acesso às portas. A bolsa fecha-se por acção de três ímanes, e não por velcro como a do anterior modelo. E traz um logotipo da Humanware em relevo que lhe fica muito bem. Enfim, um verdadeiro requinte.

Abre-se a bolsa e solta-se um aaah! de espanto. O Apex é plano, liso como um livro. E é mais fino que o seu avô. Só o teclado braille se destaca da superfície. O curso das teclas é menor, e sente-se que são rápidas a reagir. No centro, um disco rotativo rodeado pelas setas do cursor. Para que servirá? Dos lados, orifícios para saída do som, imagino eu. À frente, as já tradicionais teclas de polegar. Espreita-se por trás. O que é isto? Quase não se vê o chassis, são só portas: três portas USB, três. Leitor de cartões SD, porta VGA para ligar a um monitor e porta de rede. Solta-se um sorriso. Senti-me como um automobilista que acaba de comprar um porsche depois de andar dez anos com o opel kadett do pai. Do lado esquerdo, o botão de ligar, as tomadas de auscultadores e microfone, e um botão vermelho que vim a descobrir depois ser o botão de gravação de som. Fantástico. Do lado direito, uma porta mini USB e a ligação do alimentador. Ou seja, as três portas USB de trás servem para ligar a dispositivos externos, como pendrives, discos, impressoras, e outros. A porta mini USB serve para ligar o Braillenote a um computador, para troca de ficheiros ou para servir de linha braille de um leitor de ecrã.

Se o Apex for o que aparenta, estamos perante um caso muito sério de tecnologia. Não conheço nenhum dispositivo móvel para pessoas normovisuais com tantas possibilidades. Veja-se bem: 3 portas USB, rede cablada, rede sem fios Wi-Fi, bluetooth. Não fosse o preço escandaloso que as células braille impõem a estes aparelhos, e estou a imaginar as pessoas a fazerem fila para terem um Apex à hora de abertura da loja.

Enquanto o Braillenote carregava um pouco as baterias detive-me a ler o guia de iniciação rápida. Lamento que não venha também uma versão em Braille. Sou um braillista à moda antiga, gosto sempre de ver alguma informação em papel. Em vez disso, a Humanware inclui um CD aúdio com uma apresentação muito boa do Braillenote. É certo que está em inglês, mas correm rumores que o importador está a tratar de produzir a versão portuguesa. O guia de iniciação é muito bom. Não posso esquecer as horas que passei a ler o longo e intrincado manual do braillenote antigo. A Humanware deu ouvidos aos protestos, e fez um guia fácil de ler, e profusamente ilustrado. Não é de estranhar: muitos novos utilizadores chegam ao Braillenote por via de um professor, dos pais, ou de um formador normovisual. E com este documento a ajudar, a aprendizagem é brincadeira de crianças. Acredito que com o guia em áudio, um utilizador cego tenha a mesma facilidade.

Chegou a hora de ligar o Apex. E após alguns segundos, somos brindados pela já familiar voz robótica que anuncia o main menu. Para gáudio dos amigos do Braillenote, o sistema de menus permanece igual, mas com mais opções. Está lá o rádio FM, o leitor multimédia, o leitor DAISY, o browser de internet, o cliente de email, a calculadora, e, grande surpresa: jogos.

Lancei mão do manual de comandos, e procurei a minha opção preferida: o rádio FM. Em poucos segundos estava a ouvir a Antena 2 nos auscultadores. Rendi-me, desliguei tudo e levei-o para casa. Amanhã vou ligá-lo ao computador e explorar os menus. Por agora chega de emoções fortes...

Comentários

Gostei muito de ler a sua alegria ao receber o braillenote, mas o que é isso? Nunca ouvi falar deste aparelho, que pelo jeito, deve ser fantástico!

Um abraço e obrigado pela atenção!

Caro amigo, tem toda a razão. O entusiasmo fez-me esquecer que naturalmente muitas pessoas não conhecem esta máquina. Trata-se de um computador de mão para pessoas cegas, com uma linha braille de 18 ou 32 células e voz sintética em inglês. As dimensões são: 24 x 14 x 1,9 cm e o peso 812 gramas. O teclado pode ser de braille ou "qwerty" de alfabeto normal. O braillenote é muito portátil e permite muitas funções, entre as quais: escrever e ler notas, marcar compromissos e alertas, registar contactos, enviar e receber emails, ler páginas da internet, ouvir livros e música, ouvir rádio, fazerc álculos, e outras. É uma máquina bastante potente e que confere um elevado grau de independência ao seu utilizador. Espero que esta explicação ajude, se desejar pode escrever-me para o email rodrigues.aq@gmail.com.

Creio que seja parecido com uma tecnologia nova, desenvolvida, salvo engano pela epplo que esqueci o nome. O aparelho que estou dizendo é o Ledor de livros para videntes. é um bem pequeno, mas não sei o nome. Aproveitando a oportunidade, quero te convidar a ler minha postagem no blog do diego corrêa e comentar. Fala sobre os cegos viajarem sozinhos. Valleeeuu!

Olá Aquilino! para mim, que careço dos sentidos da visão e da audição, qualquer suporte em braille, mecãnico ou electrónico, é de extrema importãncia para a minha comunicação e autonomia. Esta tecnologia de que falas e da qual já tive a oportunidade de tocar é realmente uma ferramenta muito completa e útil, não apenas para os cegos, mas também para os surdocegos. Mas o mais triste é o seu elevado preço que o torna inacessível à maioria das pessoas com necessidades específicas... Escrevi isto através do meu telemóel e com o auxílio do meu implante coclear. Desculpa a falta dos parágrafos. Abracç