Há cerca de dois meses atrás, publiquei o texto que se segue no meu blogue pessoal e hoje decidi partilhá-lo também aqui convosco. É uma experiência traumática de que penso que muitos de nós devemos ter sido vítimas no passado sobretudo se já nascemos com gravíssimos problemas de visão como acontece no meu caso e por isso decidi partilhar para que não se sintam totalmente sós no mundo no caso de isto também vos ter acontecido e para vos incentivar também um pouco a partilhar as vossas histórias, independentemente de serem ou não parecidas com a minha!
um pouco que pensar logo àquela data. “Fases boas na escola?”, questionei-me. Ainda as tive, admito, sobretudo no liceu e durante a faculdade! Mas antes disso... A escola poderia ser realmente muito boa para mim, mas só mesmo ao nível das notas e nem sempre isto acontecia. Havia fases melhores e outras piores, chegava a haver alturas em que colecionava negativas umas atrás das outras e ainda me recordo perfeitamente de ter chegado ao fim do segundo período do 9º ano em risco sério de chumbar por acúmulo de quatro avaliações menos boas na minha pauta, mas o que me marcou decisivamente nesta época da minha vida que se prolongou desde o primeiro ano até ao fim do 8º não foi propriamente o melhor:
Aquilo que julgo ser um dos valores que nem por nada nos deveriam faltar independentemente de estarmos a trabalhar ou a estudar seja em que fase da nossa vida for a mim acabou por não me favorecer mesmo nada nesta altura e quando falo disto, venho referir-me a uma boa convivência com as pessoas com quem partilhamos grande parte do nosso dia quando trabalhamos ou então somente no caso de ainda estarmos a estudar. Com os professores e funcionários da escola essa convivência não era assim tão má quanto isso, mas fosse lá como fosse, a verdade é que nunca lhes consegui dar a conhecer um pouco mais de mim à conta de toda a timidez que aos dias de hoje ainda me caracteriza tão bem apesar de já não ser nem metade daquilo que era naquele tempo e talvez daí não ter criado grandes lassos de amizade com praticamente nenhuma dessas pessoas. Já com os colegas, o caso muda completamente de figura e no que a isso diz respeito, penso que a culpa talvez não tivesse sido exclusivamente minha como acontecia com os professores e funcionários e também eles possam partilhar comigo esse sentimento tão culpabilizante que pelo menos a mim, me continua a marcar de forma bastante decisiva até à presente data.
As diferenças existentes entre um grupo na sua totalidade e uma só pessoa que o integra nem sempre são bem aceites independentemente de se relacionarem com a nossa etnia, religião, cor de pele, etc e no meu caso foi tão pura e simplesmente o facto de a minha visão não me permitir alcançar patamares tão longínquos como a que a deles atingia que me separou definitivamente de grande parte da minha turma pelo menos até termos terminado o nosso 8º ano e as mentalidades entretanto se terem desenvolvido mais um pouco com a chegada da adolescência. As únicas pessoas que durante todos esses anos ainda se davam ao trabalho de se aproximar de mim no sentido de quem sabe, tentarem ser minhas amigas se conseguissem superar todas as diferenças existentes entre nós eram as raparigas visto que os rapazes não pareciam estar de forma alguma para aí virados, só que ainda assim… Ter segredos com alguma destas crianças que mais tarde se tornaram pré-adolescentes ou sentir o prazer de ver alguma delas à minha procura no sentido de me fazer alguma confidência ou pedir um determinado conselho… Isso era quase raro e somente com uma amiguinha lá da turma que ia pendendo mais para o meu lado que as restantes por também ser um pouco rejeitada pela quase generalidade do grupo é que ia tendo um segredo ou outro, sendo que entre nós também ia havendo, dentro da medida dos possíveis para a idade que tínhamos à época, uma certa partilha de confidências e alguns conselhos.
Lembro-me por exemplo de ela me ter falado da primeira vez que bebeu um Carolymes na companhia de alguns dos nossos colegas de turma que nessa altura pareciam estar a bem com a sua pessoa, mas relativamente às outras raparigas… Segredos e confidências para com elas não tinha absolutamente nenhuns e normalmente também não me vinham pedir conselhos nem me contavam praticamente nada a respeito das suas vidas porque muito provavelmente não me conseguiam ver como uma amiga; tudo aquilo que sabia relativamente aos seus amores e desamores por exemplo era apurado por mim e somente por mim que felizmente sempre pude desfrutar de um excelente sentido de audição capaz de alcançar sons onde elas nem sequer os conseguiriam imaginar, sendo que no entanto quando a coisa dava para o lado do mal… Aí eram logo as primeiras pessoas a vir falar comigo no sentido de me apontar o dedo, como me recordo perfeitamente de ter acontecido pelo menos uma vez, porque uma das protejidinhas que integravam no seu pequeno grupinho de amigas ia ter negativa a praticamente todas as disciplinas e segundo elas, até costumava estudar condignamente, enquanto eu, teria positiva a tudo e não me esforçava minimamente por tirar um único apontamentozinho que fosse à medida que as aulas iam decorrendo!
Isto penso que deve ter sido durante o nosso 6º ano que aconteceu, mas ainda assim recordo-me que pelo menos até entrar para o 7º (que já exigia muito mais de nós em termos de aprendizagens), nunca me esforcei por modificar o meu método de trabalho mais eficaz àquela época e que consistia tão pura e simplesmente em estar atenta às aulas de modo a poder fixar o máximo de informações possível sem ser necessário transcrevêlas para o papel. Vai-se a ver e se calhar na altura já o fiz porque muito provavelmente acreditava em mim muito mais do que hoje e esta era somente uma forma inteligente de reagir perante as suas críticas que tanto me tinham magoado conseguindo eu demonstrar-lhes por via da mesma que “me estava nas tintas” (como se costuma dizer) para o que pensavam a meu respeito ainda que não fosse de facto isso que estivesse a acontecer e aliás por falar agora na presente data e nas grandes dificuldades que sinto em ter um pouco mais de fé e confiança em mim mesma do que tenho… Não estará tudo isso relacionado com esta quase não aceitação das diferenças físicas que me caracterizavam de que fui vítima por parte dos meus colegas de escola com quem passava os dias praticamente inteiros algures durante a minha infância e inícios de adolescência? Não será à conta disso que ainda hoje sou uma pessoa excessivamente vulnerável que sente mesmo muitas dificuldades em tomar decisões completamente sozinha, sendo que quando as toma, elas acabam por se revelar algo precipitadas?
E a enorme dualidade que tantas vezes me caracteriza sobretudo no que se refere ao estado de espírito que tão de pressa pode estar bem lá no alto, como mais tarde se calhar se formos a ver já anda cá bem em baixo sentindo-me eu arrasadíssuima por razões absolutamente nulas como acontece tantas vezes, não estará também ela relacionada com estas experiências algo traumáticas que vivenciei logo desde que entrei para o infantário com quatro ou cinco anos até que terminei o 8º ano por volta dos catorze? Relacionando-se ou não tudo isto entre si, a verdade é que à presente data não consigo de forma alguma subestimar os meus “adversários” daqueles tempos porque eles parecem ter sido verdadeiramente bons naquilo que fizeram ou não tivessem muitas das suas palavras que tanto me magoavam produzido efeitos demasiadamente drásticos ao nível daquilo que sou hoje e se calhar até mesmo daquilo que penso relativamente aos mais diversificados assuntos e à própria forma como ajo no meu dia-a-dia.
Pode até nem ter sido de propósito que me dirigiram tais blasfémias porque eram crianças e hoje até compreendo que muito por culpa disso, talvez não lhes fosse mesmo nada fácil aceitar e compreender todas as diferenças que nos separavam à conta dos meus gravíssimos problemas de visão, só que ter ainda que lidar com as consequências absolutamente nefastas que restaram de toda essa experiência menos positiva pela qual passei durante a minha infância e princípios de adolescência agora que já se passaram bem mais de vinte anos sobre o momento em que tudo isso aconteceu… Devo confessar que também não deve ser muito mais fácil e só mesmo experimentando tudo aquilo por que ainda passo à data de hoje é que os meus colegas talvez conseguissem entender o quão maldosos foram para comigo ainda que certamente não o tivessem feito propositadamente.
A instabilidade emocional que tantas vezes me caracteriza não me permite, em grande parte dos casos e ainda à presente data harmonizar os meus pensamentos com as atitudes que adopto e daí que não seja mesmo nada raro provocar discussões absolutamente inúteis sobretudo em contexto familiar e à conta de certas questões algo mais sérias como é por exemplo o caso dos gravíssimos problemas do meu pai com o álcool com os quais não me consigo conformar de forma alguma. Da angústia quase constante que sinto diariamente por tudo e por nada e vá-se lá saber à conta do quê acho que nem sequer deve valer a pena falar. Afinal de contas não foi mesmo nada fácil crescer assim como cresci e a sentir vergonha de mim mesma por ser portadora de gravíssimos problemas de visão já muito próximos da cegueira total e achar que era esse o sentimento que todos aqueles que me rodeavam nutriam em relação a mim visto que era isso que os meus colegas de turma também pareciam sentir, sendo que o resultado que agora obtenho ao fim de toda essa experiência não é de forma alguma o mais positivo de todos e quase se pode traduzir em personalidades absolutamente contraditórias que me dominam e me fazem adoptar comportamentos completamente diferentes perante uma mesma situação em dias também distintos. Considero deste modo que uns dias devo ser Sol e outros Lua, aceitando em certas ocasiões melhor do que em tantas outras as palavras que aqueles que me rodeiam me dirigem independentemente de as mesmas chegarem até mim por bem ou por mal, mas conseguir desfrutar da vida com sentimentos de calma e serenidade… Isso decisivamente não consigo e normalmente o que costumo fazer é mesmo passar o meu dia-a-dia a questionar-me sobre o verdadeiro porquê de a vida ainda não ter parado de se vir cruzar no meu destino, presenteando-me quase sempre com prendinhas envenenadas como é por exemplo o caso dos meus problemas de visão que já passaram a cegueira total há cerca de quinze anos, da vivência conturbada que tive lá por casa sobretudo nestes últimos seis anos à conta dos problemas do meu pai com o álcool e agora mais recentemente, também da morte da minha mãe que ainda nem sequer consegui entender se já aceitei devidamente ou se este será um processo pelo qual só terei que passar mais tarde.
Hoje foi assim um desses “porquês” que veio fazer com que decidisse expôr aqui pelo blogue este meu ponto de vista pessoal relativo aos meus coleguinhas de turma da Primária e Ensino Básico ainda que também tenha a mais perfeita noção de que talvez devesse ter optado por fazê-lo em qualquer outro espaço menos formal do que um blogue público ao qual toda a gente poderá ter acesso desde que seja esse o seu desejo, a constante interrogação que trago em mente já desde há alguns mesinhos e me vem perguntar se não poderia ser uma pessoa bem mais desinibida do que sou à data de hoje e mesmo face à minha cegueira total se nos meus tempos de escola não tivesse sido tão mal tratada podendo já mesmo falar-se numa espécie de booling apesar de àquela época tal termo ainda não existir. Peço assim imensas desculpas a eventuais leitores que se possam sentir algo atingidos com a publicação deste meu texto, mas actualmente é mesmo assim que penso e como a minha mãe costumava dizer tantas vezes, “Quem fala a verdade não merece castigo” e eu ainda muito menos devo merecer até porque castigada de mais já me sinto pela vida tal como acabei de referir por via deste meu post. E exactamente por pensar assim, decidi redigir todas estas linhas até porque estava mesmo a precisar de o fazer como forma de uma espécie de desabafo, espero que com elas não esteja a ferir susceptibilidades, mas é que a verdade por mais dura e crua que até possa parecer, é que sinto no mais profundo de mim que poderia ter sido uma pessoa bem diferente para melhor se há alguns aninhos atrás não tivesse passado por uma experiência tão negativa como esta que em tudo me parece já ter a ver com o booling!
- Partilhe no Facebook
- no Twitter
- 2276 leituras