Louis,
Permite-me que te escreva como quem fala a um velho amigo,
embora nunca nos tenhamos cruzado em carne e osso.
Hoje, no dia em que celebramos o teu nascimento,
sinto que tenho uma dívida contigo,
uma que jamais poderia saldar
com palavras ou gestos,
mas apenas com o peso do meu reconhecimento eterno.
Quando fiquei surdocego, o mundo tornou-se um deserto sem som nem forma.
O silêncio era uma muralha intransponível,
a escuridão um manto pesado que sufocava os meus dias.
Sentia-me perdido, condenado a uma ilha onde só havia vazio,
onde os meus pensamentos gritavam, mas ninguém os ouvia.
Ninguém… até que encontrei o teu alfabeto.
E foi aí que descobri a tua luz,
uma luz que não brilha nos olhos, mas nas pontas dos dedos.
Louis, o que tu criaste é mais do que um sistema de leitura,
é um mapa para regressar à vida.
Com os pontos que alinhavas no papel,
reergueste mundos que julgava perdidos para sempre.
Nas primeiras vezes que toquei o teu código,
as minhas mãos tremiam como as de uma criança
que tenta dar os primeiros passos.
Era difícil acreditar que algo tão simples —
apenas seis pontos, dispostos em infinitas combinações —
pudesse abrir portas tão grandes.
Mas ali estava eu, a descobrir palavras,
a sentir frases,
a tocar pensamentos que outros antes de mim haviam deixado.
Louis, tu devolveste-me as histórias.
E mais do que isso, devolveste-me a possibilidade de contar as minhas.
Através do Braille, o meu silêncio transformou-se em comunicação,
a minha escuridão em partilha.
Os teus pontos fizeram-me ouvir o som das palavras,
mesmo sem ouvidos,
e ver o horizonte de ideias, mesmo sem olhos.
Hoje, cada página que leio é um tributo à tua coragem.
Cada livro que toco é um abraço que te envio através do tempo.
Tu, que aos três anos enfrentaste a tua própria escuridão,
não te rendeste a ela.
Transformaste-a em dádiva, em invenção.
Fizeste dos teus próprios limites
um farol para todos nós que viríamos depois.
Tu és a prova de que a força humana não tem limites,
de que a adversidade pode ser o berço de algo imenso.
E agora, quando os meus dedos deslizam por estas palavras,
sinto que não estou sozinho.
O Braille é uma ponte.
Ligaste-me ao mundo, às pessoas, a mim próprio.
Neste dia 4 de janeiro, não celebro apenas o teu nascimento.
Celebro a tua visão,
a tua empatia por todos os que, como tu,
já não podiam ver o mundo da forma tradicional.
Fizeste do impossível uma realidade,
e eu sou uma das muitas vidas moldadas pelo teu génio.
Obrigado, Louis,
por dares luz à minha escuridão,
som ao meu silêncio,
e significado a uma existência que pensava perdida.
Hoje e todos os dias,
a minha gratidão será eterna.
Comovidamente,
De alguém que viveu graças à tua invenção.
Marco Branco
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