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Áudio-descrição: Opinião, Crítica e Comentários - blog de Francisco Lima

Aos Professores, uma breve mensagem

por Francisco Lima

Prezados,

Percorrendo uns arquivos antigos em meu computador, deparei-me com o rascunho de uma fala que fiz aos professores, no estado de Alagoas, no nordeste brasileiro, já há uns bons anos.
Entretanto, penso que a fala ainda é válida.
Sendo um rascunho para fala, a estrutura final foi diversa do que aqui apresento, muito embora o conteúdo tenha sido o mesmo.
Adianto, contudo, que o texto, aqui apresentado, não é o texto completo: este, não achei!
Espero que lhes sirvam as palavras que agora transcrevo:
"Prezados senhores e senhoras, professores amigos:

Como sempre me ocorre, ao ser chamado para falar para um público destes, para partilhar minhas idéias, minha leitura de mundo e o conhecimento que outros partilharam comigo, seja por meio dos livros, artigos e demais escritos que chegaram às minhas mãos, seja pela experiência a mim relatadas, confidenciadas, por vezes, denunciadas mesmo, fico num misto de profundo prazer, satisfação pessoal e indisfarçável sentimento de sentir-me importante. De outro lado, fico apreensivo, preocupado e com um grande sentimento de não ser capaz de fazer jus aos autores que estudei, portanto, não sendo capaz de os bem representar ou reapresentar. Mais ainda, fico com o sentimento de que tenho muito que falar das experiências, das discriminações, dos preconceitos que um sem número de pessoas sofreram/sofrem e que, uma vez conhecidos, uma vez deles tomada consciência, outros poderão não passar, já que se espera que quando tomamos consciência de algo, de algo ruim, não o pratiquemos mais. Mas, isso não é tudo, o sentimento que me toma, ainda, é o de que tenho tão pouco tempo, para tanta coisa a fazer que me sinto menos que um grão de areia na imensidão dos mares; sinto-me impotente ao saber que tanto precisa ser feito para melhorar este nosso mundo e tão pouco, quase nada mesmo, posso fazer para isso.

Assim, meus amigos, neste misto entre saber de minha responsabilidade e a imensidão de meu dever e de sentir-me pequeno para o fazer, lembro-me de uma fala da mãe de um garoto com TDAH que vinha sofrendo preconceito numa escola de uma grande universidade federal e que por aquela altura, lutava na justiça pela aprovação do garoto que não houvera recebido as condições adequadas, necessárias e de seu direito para aprender com qualidade, igualdade de condições e oportunidades. Disse-me ela então:

Professor, lembra-se da história de Davi e Golias? Sim, respondi, pois embora não seja religioso sabia que havia sido uma história bíblica em que um jovem garoto não muito forte se oferecera para lutar contra um grande e poderoso gigante, quando outros guerreiros fortes e corajosos teriam-se recusado a fazê-lo.

Então ela completou:

“Pois é, ele pensou que com um gigante daquele tamanho ele não poderia errar. Não poderia errar e não errou! Jogou uma pedra bem na testa do gigante e o colocou por terra.

Pois é, meus senhores, Davi bateu certo, no lugar certo, com a arma certa. Logo, não precisou da força extraordinária que se pensava ser necessária para acabar com o gigante, mas do uso adequado dela.

Meus caros professores, nosso gigante é o preconceito, as barreiras sociais, barreiras atitudinais, que temos para com os alunos com deficiência; nosso gigante é a exclusão que, de tão grande, não poderemos errar se usarmos a arma certa, atingirmos no lugar certo, com a força certa.

Sei que somos pequenos, mas sei também que somos um grande número de Davis, lutando contra este gigante, a sociedade excludente. E se no passado, um só Davi fez o que fez, imaginem todos estes Davis que aqui hoje estão. Vocês e eu podemos deitar por terra o gigante que assombra nossos lares, nossas escolas, nossa cidades, nossa pátria!

Daí, meus amigos, com esta reflexão, sinto-me forte, revigorado, verdadeiro super-herói que acaba de pegar sua arma poderosa e bato pesado, tão pesado que, na maioria das vezes, os que me ouvem, ou lêem precisam um tempo, antes de verificar que não estou batendo contra eles , mas que estou batendo contra uma história que nos fez preconceituosos, discriminatórios, cheios de barreiras atitudinais, por vezes disfarçada de bondade, de sentimento altruísta, de comiseração e amor pela pessoa com deficiência, mas que, no fundo, implica mesmo numa baixa expectativa que temos a respeito dessas pessoas; da baixa estima que temos por elas; da estigmatização, generalização e da desconfiança que lhes dispensamos.

Sob o manto de que estamos fazendo o melhor pela pessoa com deficiência, denegamos-lhes direitos, por exemplo, o da educação, com as demais pessoas, nas escolas comuns/regulares; sob a desculpa de que não estamos preparados para os ensinar, procrastinamos a participação deles em nossas aulas, ou, como é mais comum, nem os deixamos entrar em nossas classes etc.

As pessoas com deficiência que contribuíram e contribuem para o avanço de nossa cultura mundial, para o melhor desenvolvimento de nossa sociedade, para a melhoria da educação das pessoas, para nosso entretenimento etc. são muitas, são muitas mesmo! Entretanto, são bem mais as pessoas com deficiência que estão em nossos bairros, em nossas cidades, em nossos Estados em nosso país. Todavia, meus professores, são bem poucos, bem poucos mesmo as pessoas com deficiência na escola, no ensino fundamental e vergonhosamente menor o número delas no ensino médio e no superior, na universidade!

Como podem ver, o gigante é enorme, mas insisto, podemos matá-lo. Podemos matá-lo e arma de que dispomos são as leis, são, acima de tudo, nossa consciência e nossa prática diária de inclusão, contra atos excludentes que nós mesmos praticamos, perpetuamos com nossas ações ou falas, pior ainda, que, como professores, retransmitimos para nossos alunos ou os deixamos continuar a praticar, sem que os encimemos do contrário.

Meus queridos mestres, cada um de vocês tem obrigações éticas e morais para com a transformação da sociedade, ainda maiores que a maioria das outras profissões e dos demais profissionais. Vocês e eu trabalhamos com uma matéria prima que se chama gente, cujo produto final será seres humanos. Cada um de vocês e eu somos responsáveis pelas pessoas humanas a quem ensinamos, a quem deixamos de ensinar, a quem deveríamos estar ensinando e a todos os filhos delas, seus netos bisnetos etc. Somos responsáveis pelas pessoas que conhecemos ou que nos conhecem, mas somos também responsáveis pelas pessoas de quem jamais ouviremos falar ou que de nós ouviram dizer. Mestres, somos responsáveis por uma nova sociedade, mais inclusiva e menos excludente.

A que está aqui está bichada; está estragada, não presta a todas as pessoas, essas mesmas pessoas humanas pelas quais somos responsáveis e que por nnós são responsáveis também.

Mudemos esta sociedade, transformemo-na; derrubemos este gigantes, Davis brasileiros, acabemos com ele, Davis alagoanos, matemos o infame, meus Davis humanos!

Precisam de mais argumentos para o fazerem?

Minha inclusão é a sua; a prática inclusiva que tiver hoje, será sua própria inclusão já. A inclusão não é um ato unidirecional, mas uma mão de duas vias em que cada ação inclusiva retorna a quem praticou e, num mundo capitalista, podemos dizer, retorna com lucro garantido.

Mas, como fazer a inclusão? A este momento vocês devem estar ansiosos por perguntar e receber respostas.

Responder a isso é, de fato, fácil e simples: é que fazer inclusão é simples e fácil!

Simples, porque é só fazermos o que gostaríamos de que fizessem por nós, nos respeitassem, nos dessem igualdade de condições e oportunidades de acesso aos bens e serviços, que nos permitissem sermos nós mesmos e nos dessem as condições de e para decidirmos por nós mesmos independentemente. Em outras palavras, que pudéssemos exercer nosso empoderamento com independência e, sempre que necessário, com os recursos de autonomia disponíveis.

É fácil, porque para alcançar isso tudo só é preciso que não se ache que dar ou permitir significa ato voluntário de alguém que, por ser bonzinho dá ou permite a uma pessoa com deficiência que seja ela mesma, que venha a ter seus direitos respeitados, que possa ela ter acesso aos bens e serviços, com igualdade de oportunidade e condições, pelo sentimento de condescendência, pelo paternalismo, pela benevolência de você em relação à pessoa com deficiência.

Mas, disso já tratei, estando pois, repetindo-me. E o faço por ter convicção de que só ainda não se tem tudo isso, porque barreiras atitudinais de muitos impedem um número, ainda maior de pessoas de e exercer o verdadeiro significado de ser humano, de ser cidadão, de ser indivíduo.

Todavia, estamos num encontro de mestres e de educação é mister que tratemos mais diretamente.

Assim, deixe-me fazer a assertiva de que não há uma pedagogia da deficiência; que não há uma técnica ou técnicas de ensino da pessoa com deficiência, mas há técnicas que respeitam mais ou menos os processos de aprendizagem das pessoas, assim respeitando mais ou menos os processos educacionais das pessoas com deficiência também.

As inteligências múltiplas, uma vez respeitadas, é um bom exemplo de como se pode fazer uma aula tornar-se inclusiva. O conceito de desenho universal aplicado à educação é imprescindível para uma educação inclusiva, uma vez que do desenho universal (planejamento da aula para a maior parte) se tira a inclusão, ensino para todos.

Isso significa que se você pensa sua aula, planejando-a para atender a diversidade de seus alunos, da maioria deles, na existência de uma necessidade específica de um deles e não estou nem falando de deficiência aqui, se você precisar adequar sua aula para uma dada necessidade do aluno ou alunos, como você já planejou sua aula universalmente você conseguirá adequada para todos.

A inclusão se faz, na maioria das vezes, pela atitude=ação do professor, de maneira proativa, mais que pelos recursos econômicos e tecnológicos disponíveis. Fosse sempre necessário ter tudo isso, grandes escolas, escolas ricas, seriam inclusivas, o que não podemos afirmar que são, meramente por serem ricas, por terem clubes em forma de escolas, por terem mais cifrões do que humanidade, isto é, mais recursos materiais do que humanos.

Uma pessoa disléxa precisa de aulas que contemplem sua necessidade de ter textos mais curtos para sua compreensão, o que pode ser alcançado pelo uso de resumos ofertados a ele, por seu professor. A prática de fazer o resumo do texto dará ao professor as habilidades necessárias para seu próprio desenvolvimento. Um aluno com superdotação precisará que seu professor tenha disponível aulas mais ricas e estimulantes, desafiadoras: diversificar a aula, não tornando-a monótona é rico para todos e o desafio para aprendizagem é uma ferramenta valorosa, mormente se não for atrelada a cobranças acadêmicas exageradas, na forma de provas, testes e outros dispositivos de avaliação, desta ou daquela ordem.

Um aluno com autismo requererá do professor que formule suas aulas de maneira a seguir rotinas, a descortinar ao aluno o que fará adiante etc. O planejamento da aula e a rotina de seu andamento permite a todos que se organizem para o que vem, eliminando grande parte da ansiedade pelo porvir e pelo sentimento de abandono perante o desconhecido.

Uma pessoa com hiperatividade pode requerer do professor que varie suas atividades, sem que uma só se torne enfadonha e desnecessariamente prolongada, quando se pode fazer várias atividades menores e diversificadas. A variação das estratégias de aula, tanto quanto do conteúdo e das técnicas de aula farão com que um aluno hiperativo esteja sempre se deparando com estímulos novos, sem que se perca a rotina das atividades, o desafio das proposições etc., o que se pode alcançar, por exemplo, oferecendo vários textos menores a respeito de um assunto que se deseja ensinar.

Uma pessoa cega pode requerer que se lhe dite ou áudio-descreva o que se está na lousa ou que se está projetando na transparência ou slides: fazer isso permitirá ao disléxo ouvir o texto que pode não ter entendido pela leitura; permite ao indivíduo hiperativo que ouça o texto ainda que esteja se movimentando pela sala, sem olhar diretamente para a lousa; permite ao aluno com autismo ter acesso ao material, a que ele poderia não estar olhando ou que lhe estivesse fora do campo visual;

Ditar ao aluno com deficiência visual, permite com que crianças superdotadas venham a descobrir os benefícios da rposódia, do transmitir conhecimento, do conhecimento de quem vem a ser colaboração em lugar de competição, visto que não se estará competindo pelo quem chega antes, aprende mais rápido etc. mas se estará cooperando para que a aprendizagem se dê com todos, para todos, entre todos.

Uma pessoa com deficiência intelectual poder´requerer do professor que repense sua atividade, seu objetivo de aula etc., sem contudo, que ele tenha de desviar de sua meta maior, a de ensinar a todos.

Um aluno com deficiência poderá precisar que o professor passe a simplificar o modo que ensina, ensinando com qualidade e completude aquilo que fazia de maneira complicada e incompleta. E isso tudo fará do professor um professor melhor para todos, beneficiando o professor e os alunos dessa oportunidade que a pessoa com deficiência está oferecendo a todos, quando ela está entre os alunos sem deficiência.

Uma pessoa surda, por exemplo, dá ao professor e outros alunos a oportunidade de que todos aprendam uma segunda língua; que aprendam a comunicar de modo diverso a uma maneira mais tradicional a que estão acostumados; que aprendam o valor de uma língua e o significado da valorização da língua para a cultura de um povo, visto que é pela comunicação que pessoas surdas ou não solidificam o sentido de cidadania e de nacionalidade de um povo. Pessoas surdas e não surdas no Brasil, falando línguas brasileiras oficiais, sejam de sinais seja oral se tornam mais brasileiras, na medida em que passam a respeitar esse bem do povo brasileiro, importante parte da cultura de um povo a língua. A língua oral ou de sinais, não importa.

As pessoas com deficiência estudando num curso médio, num curso profissionalizante etc. mostram ao professor a capacidade de criação, de produção intelectual, de capacidade de fazer ciência com toda a diversidade da pessoa humana, que pode não ter sido percebida pelo professor, porque ele deixou de ver o aluno para ver alunos, deixou de ver uma criança para ver crianças; deixou de ver o indivíduo, para ver a maça.

Ensinar é se permitir aprender com o outro, aprender com o aluno a maneira pela qual este aprende. E o professor que se permite ser ensinado ensina o professor que se permite aprender ensina, o professor que apenas dá suas aulas, perde a oportunidade de ensinar.

Mas, o que, de fato, podemos aprender? Que podemos ensinar aos alunos com deficiência?

Se você é professor de contabilidade, pode ensinar contabilidade; se é professor de computação, pode ensinar isso mesmo, computação, para um aluno cego, uma aluna surda, outro aluno com deficiência intelectual etc. Você é professor de dizem? Pode ensinar a todos, tanto quantos eles forem seus alunos, sejam com deficiência ou não, tenha o número de alunos com deficiência em sua sala que tiver.

Você é o professor, você é capaz de ensinar; você sabe o que precisa ser ensinado; você é o que domina o conteúdo a ser ministrado, você é quem sabe da sua matéria e não o colega da psicologia, da medicina, da fototerapia, da terapia ocupacional da fisioterapia etc. Estes são profissionais da saúde, você, o profissional da educação e é de educação que estamos falando.

Conhecer as deficiência dos alunos pode lhe ajudar, mas é mais provável que lhe atrapalhe, caso você não tenha solidificada a postura de que seu aluno é aluno e não a deficiência que tem.

Seja você mesmo, estude sua área de atuação, pois é nela que você encontrará as respostas para ensinar. Um aluno com deficiência não lhe exigirá mais tempo que outro, se você tiver sua aula adequada para todos; seu aluno não lhe será um estorvo se você não lhe estorvar a aprendizagem, em lugar de apoiá-lo, na aprendizagem etc.

Faça sua aulas breves, com pequenos tópicos que vão se aprofundando no contexto; antecipe os materiais para os alunos, trazendo ao alunos surdos e cegos, com deficiência intelectual, ou com hiperatividade, aquilo que você vai trabalhar, de modo que possa se preparar para o "novo".

Comentários

Olá Francisco !

Eu, de facto não sou professor, mas de facto, encontrei no teu texto alguns pontos deveras interessantes | loool

Bom, todos nós sabemos q a exclusão, a discriminação, faz parte do dia a dia, embora não devesse fazer !
Mas tb é certo, que o Gigante da exclusão, tá mais magro, deve andar no programa do peso pesado da sic ! hehehe
Ou seja, há cada vez mais inclusão, embora a 1 ritmo mto lento !

Agora o cerne da questão: o q poderemos fazer para q haja + inclusão ?
Primeiramente, isso tem de partir de nós, da nossa activide e/ou postura perante a sociedade, seja na escola, no trabalho ... cada um no seu ramo específico !
E temos q dar bom testemunho, mas não é só teorias, porque disso tá o mundo cheio, mas tb de acção, q é senão o mais importante !
Quando cruzamos com pessoas q nos excluem, porque não interrogá-las e pô-las a pensar ? é mtas vezes destas coisas q elas vão mudando de actitude !
Outra possibilidade é pertencermos a um movimento ou associação de e para deficientes, para q unidos, consigamos coisas concretas, tais como, sensibilizações, + rampas nos passeios, + estacionamento pra deficientes ... !

Não podemos desanimar, porque a luta é intensa e duradoura, temos q ser bastante determinados e lutar sem cessar ! lol

É óbvio q se pode ensinar pessoas deficientes, mesmo os q possuem défice cognitivo, embora a aprendisagem destes possa ser mais lenta, mas com paciencia e determinação, chega-se lá ! E nisto um prof deve dar o exemplo !
Claro q o prof, terá q se adequar às circunstâncias de cada um, lendo por ex livros q expliquem como agir pra cada tipo de deficiência !
Mas na hora de agir, agir com mta simplicidade e delicadeza, respeitando as circunstâncias de cada aluno, para que estes se sintam bem nas aulas, e contribuir para a sua integração com os restantes alunos sãos !

Abraços