O termo "visão cega" pode parecer contraditório, mas na verdade é um efeito curioso no qual pessoas que não enxergam em parte do campo visual devido a danos cerebrais ainda são capazes de reagir a estímulos na área cega. O pesquisador Arash Sahraie e sua equipe da Universidade de Aberdeen, na Escócia, descobriram que se esses pontos cegos forem estimulados repetidamente por vários meses, a capacidade de usar a visão cega pode melhorar, pelo menos em testes de laboratório. O estudo foi publicado em setembro no site da revista Proceedings of the National Academy of Sciences USA.
Derrames, traumatismos ou cirurgias podem causar a chamada "cegueira cortical" ao eliminar uma parte do córtex visual, a região do cérebro que recebe dados dos olhos. Acredita-se que visão cega aconteça porque o cérebro é capaz de redirecionar a informação visual que os olhos, ainda intactos, o enviam. Pacientes com visão cega são capazes de "adivinhar" cores, movimentos e até expressões faciais localizados no ponto cego, mesmo quando afirmam nada enxergar. Alguns grupos de pesquisa tentaram identificar melhorias na visão cega após estímulos repetidos, mas esses estudos geralmente envolviam a introdução de estímulos próximos aos limites do ponto cego. Nesse caso, os dados não são tão confiáveis, pois os pacientes podem ter mudado a direção do olhar rapidamente, sem que isso fosse detectado.
Para eliminar essa fonte de incerteza, Sahraie e seus colegas pediram a 12 pessoas com cegueira cortical que praticassem com estímulos apresentados no meio de seus pontos cegos. Todos os dias, por três meses, e usando computadores em casa, eles adivinharam repetidamente qual dos dois estímulos era apresentado primeiro - um campo circular vibrante com linhas pretas e brancas, criado para estimular ao máximo seus córtices, ou um ponto cinza. Após o treinamento em casa, os participantes melhoraram seus resultados em um teste de laboratório: em média, o número de adivinhações corretas aumentou entre 5 e 10%. Com uma freqüência duas vezes maior, eles também disseram estar conscientes da alternativa correta. Entretanto, ao terem sua visão cega testada em outra parte do ponto cego, longe do centro, os participantes não relataram nenhuma mudança no estado de consciência e apenas uma pequena melhora em sua capacidade de distinguir estímulos. "Esses resultados são muito encorajadores, mas um exame clínico será necessário para determinar se a técnica realmente melhora a qualidade de vida do cego", diz Sahraie.
Segundo o neuropsicólogo James Danckert, da Universidade de Waterloo em Ontário, Canadá, que não participou do estudo, "trata-se de uma demonstração notável da maleabilidade do cérebro adulto. As mudanças ocorreram muito tempo depois do dano neural". Para obter melhorias ainda maiores, no entanto, ele diz que os participantes têm que desenvolver toda a sua área cega.
Fonte: http://www2.uol.com.br/sciam/conteudo/noticia/noticia_173.html
Nota: contribuição, via e-mail, de Shirley.Candido.
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