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Opinando - Blog de Filipe Azevedo - blog de Filipecanelas

Participação no Seminário O Mundo ao Contrário

por Filipecanelas

Caros leitores.

Ontem, dia 31 de Maio de 2011, Participei no Seminário o Mundo ao Contrário, organizado pelo serviço Bai da Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva, com uma comunicação à qual dei o título:
como potenciar a utilização das tecnologias de informação e da comunicação no percurso escolar de uma criança deficiente visual.
Apresentei algumas tecnologias de apoio, e fiz algumas reflexões que me parecem oportunas.
Partilho convosco o texto integral que escrevi de propósito para esta comunicação.
Início.
Em primeiro lugar, quero agradecer o honroso convite que me foi formulado pelo Bai, e pela Rita Magalhães. Em segundo, cumprimento todos os meus caros colegas de painel, e em terceiro, quero dizer que espero estar à altura do nível deste debate, e das expectativas depositadas pelos organizadores, e por todos quantos decidiram aqui vir.
É com grande prazer que estou aqui convosco, para falar de tecnologias de apoio, mais direccionadas para as crianças com problemas visuais, e num tempo em que a sociedade da informação e do conhecimento representa nas nossas vidas um papel quase tão importante como comer ou respirar, não podemos permitir que por mera falta de conhecimento, o acesso por parte dos deficientes visuais fique de certa forma comprometido.
Para que isso não aconteça, é importante conhecer o desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação, e perceber de que forma elas podem ajudar os deficientes visuais a estarem integrados na tal sociedade da informação.
Esta minha comunicação estará focada na vertente do ensino das crianças cegas e com baixa visão, não numa vertente pedagógica, mas sim numa perspectiva tecnológica.
Começo por falar das crianças amblíopes, por serem as que regra geral demoram mais tempo a encontrar o apoio e condições necessárias para que o seu percurso escolar decorra de uma forma harmoniosa.
Falar da baixa visão é muito mais complexo do que falar da cegueira total.
Se em relação aos cegos, temos apenas um tipo de cegueira, o que faz com que a avaliação seja muito mais precisa, concreta, objectiva e generalizada, o mesmo não se passa com a baixa visão, onde há vários tipos de ambliopia, e mesmo dentro do mesmo tipo, cada pessoa terá uma equidade visual diferenciada.
Por exemplo, uma pessoa com visão tubular pode usar uma bengala nas suas deslocações porque assim reduz o número de encontrões, mas pode perfeitamente conseguir ler sem precisar de usar óculos, e ser acusada de estar a fingir que é cega.
Por outro lado, um outro amblíope que tenha uma visão turva, pode conseguir deslocar-se sem bengala, mas terá dificuldade em ler e reconhecer pessoas na rua, o que pode fazer com que ele seja acusado de ser antipático por não cumprimentar os vizinhos.
Portanto, temos forçosamente de ser muito criteriosos e rigorosos na avaliação que vamos fazer, para que a prescrição das soluções seja de facto a mais adequada.
Assim: Deve haver sempre um ou mais períodos experimentais até à prescrição definitiva.
A criança deve tomar contacto o mais cedo possível com os equipamentos, para que se sinta encorajada a usá-los, e evitar que ela se comece a sentir demasiado auto confiante, e interiorize a ideia que não precisa deles.
Há no mercado, diversas soluções tecnológicas destinadas a apoiar pessoas com baixa visão.
Os ampliadores de ecrã, permitem ampliar a informação que está no monitor do computador.
Temos várias soluções no mercado, sendo que existem alguns denominadores comuns:
A capacidade de ampliar a imagem dezenas de vezes com alta definição de texto e opções de alto contraste, ampliação dos ícones, e apoio de voz, fundamental caso o utilizador queira por exemplo ouvir um texto, sem estar a cansar a vista a lê-lo.
Os três programas mais utilizados actualmente são:
Magic for Windows fabricado pela Freedom Scientific, o Zoomteste fabricado pela ai squared, e o Supernova fabricado pela dolphin.
O próprio sistema operativo Windows contém uma aplicação chamada magnifier, que já dá algum apoio, mas apesar de valer sempre apena experimentar, os programas específicos de ampliação de ecrã são bastante mais completos, e na maior parte dos casos, usar apenas o que vem incorporado no sistema operativo não chega para satisfazer as necessidades do utilizador.
Os programas de ampliação configuram a solução mais económica, porque não obriga à aquisição de nenhum hardware específico, porque o software vai usar apenas os recursos de um vulgar computador.
No entanto, temos outras soluções que podem ser usadas como complemento, e que são as seguintes:
Ampliadores, digitalizadores e leitores autónomos.
Estes equipamentos, são bastante recentes, e tratam-se de máquinas que conseguem ampliar um texto escrito numa folha de papel, e caso o utilizador assim o pretenda, também são capazes de ler o texto em voz inteligível.
A vantagem destes equipamentos é que não precisam de estar ligados ao computador, bastando ter apenas uma vulgar televisão se quiser ler o texto ampliado, e caso apenas o queira ouvir, nem sequer precisa da Tv.
Os equipamentos que neste momento estão a ser comercializados são:
O VOCATEX PLUS e o Orabis
Existem também as lupas de ampliação electrónica. Temos as lupas de mesa, as lupas de mão, e as telelupas.
Na sala de Aula, uma solução extraordinária a ser usada pode ser o clearnote.
O Clearnote é um ampliador vocacionado precisamente para o ensino.
Através da ligação à porta USB de um computador, o equipamento amplia os textos colocados sobre uma mesa. Pode ainda, rodando a câmara 90 graus, ampliar com grande potência uma imagem do quadro da sala de aula, permitindo ao aluno ler o que o professor escreveu.
O equipamento possui ainda um sistema inteligente de memorização de definições específicas de ampliação e cores, para que possam ser repetidas sem precisar de ajustar os controlos novamente.
Se a criança precisar por exemplo ler um livro sobre a mesa, e alternar com a vista à distância para o quadro de parede, ao rodar a câmara, o ClearNote ajusta-se automaticamente à focagem e grau de ampliação necessário em cada uma destas posições.
De facto o Clearnote tem uma capacidade espectacular para captar imagem ao longe.
Temos também um outro produto, que se chama Strix.
Trata-se de um equipamento que se pode considerar parecido com o clearnote.
No entanto, o Strix é mais indicado para ter em casa, porque é menos portátil do que o Clearnote.
Enquanto o Clearnote não tem monitor, e só funciona ligado ao computador, o strix tem um monitor TFT de 17 Centímetros.
Para além disso, o Strix tem ainda:
modo fotográfico e de alto contraste preto/branco e branco/preto;
Auto-foco;
Saída para TV;
E Ligação ao computador para ampliação em ecrã dividido.
Temos também as lupas de Mesa.
Este tipo de equipamentos, é mais vocacionado para o estudo, para quem precisa de ler muito.
Apresentam uma melhor qualidade de imagem do que os exemplos citados anteriormente, mas são apenas ampliadores, e não os substituem.
as duas lupas de mesa mais populares, são a Clearview e a myReader.
A Clearview apresenta um tabuleiro móvel, contendo uma patilha para o prender na posição que desejarmos.
O clearview também permite configurar o brilho das cores, e tem um ponto vermelho que podemos usar como referência, para sinalizar a parte do texto que estamos a ler.
O myReader tem a particularidade de ter um scanner incorporado que permite digitalizar documentos, se bem que neste caso será sempre preciso um computador e um programa de OCR.
Tem a desvantagem de o tabuleiro ser fixo, e também de apenas dar para alterar o contraste e não o brilho.
Tem uma outra vantagem que é o facto de podermos manter o texto em linha ou em coluna.
Nas lupas de mão, a mais popular é a Fairview.
A farview permite ampliar a imagem, estabilizar o ponto de visão, e tem um cursor que vai deslizando no texto, permitindo que o possamos ler como se ele estivesse à nossa frente.
Pode ser ligada ao computador, permitindo que se passem imagens da Farview para o Pc, ou vice-versa, e tem ainda uma saída VGA.
Tem uma memória capaz de guardar até 100 imagens, e até permite ao aluno focar a imagem que está por exemplo no quadro da sala de aula, e congelá-la, podendo vê-la tranquilamente mais tarde, e ajustar as definições ao seu gosto, embora o processo não seja tão transparente assim, porque é preciso que o aluno esteja perto do quadro, e que aja bastante luz na sala de aula, por forma a que a qualidade da imagem capturada seja aceitável.
Em todos estes equipamentos, convém vincar a ideia que defendi atrás.
É extremamente importante que o utilizador os experimente, porque uma pequena nuance da sua incapacidade visual, pode fazer toda a diferença. E podemos pensar que estamos a dar à criança o melhor equipamento do mercado, quando uma outra solução eventualmente mais barata, ser-lhe-ia muito mais útil.
E também existem outro tipo de equipamentos que não foram aqui apresentados, por manifesta falta de tempo, e que podem perfeitamente ir de encontro às necessidades do aluno com baixa-visão.
Nós na delegação de Braga da Acapo, temos vários acordos com empresas e entidades que têm estes equipamentos, e aqueles que quiserem podem falar connosco, e juntos tentaremos encontrar a melhor forma de possibilitar à criança estar o tempo que for necessário com cada um destes aparelhos.
Depois da criança ter tido contacto com algumas destas soluções, e já se ter chegado a uma conclusão sobre aquelas que serão as mais adequadas, é importante perceber se:
O aluno mostrou ou não interesse em usar o que lhe foi prescrito,
se regra geral os recursos eram usados pelo próprio aluno, ou na maior parte dos casos ele só o usava através da influência de terceiros,
E se a criança melhorou o seu desempenho escolar a partir do momento que passou a usar os equipamentos de apoio.
É também importante saber se o professor da disciplina sentiu alguma dificuldade em orientar o aluno a usar os equipamentos, e também se o referido professor acha ou não que tais equipamentos são úteis na realização da maioria das actividades curriculares.
Estes são os principais itens, para que se possa fazer uma avaliação minimamente credível das soluções que foram indicadas para a criança com baixa visão.
Veremos agora em que é que a tecnologia pode ajudar as crianças cegas totais a exercerem o seu estudo.
No início do processo escolar, altura em que a criança vive o seu processo de alfabetização, o Braille tem de ser naturalmente introduzido intensivamente, não fosse este o único meio de leitura e escrita para pessoas cegas.
Temos então as famosas máquinas perkins Braille, que todos certamente já conhecemos, e que imaginem, já têm quase 100 anos!
É através destas máquinas, que a criança vai aprender a escrever. Elas representam, digamos assim, a vossa caneta.
Apesar da antiguidade destas máquinas, ainda são a ferramenta manual mais eficiente.
Uma empresa portuguesa, trouxe para o mercado um novo modelo da Perkins Braille, que promete algumas inovações tais como a possibilidade de se apagar o Braille no Papel, a diminuição de ruído etc. Mas infelizmente, na prática estas novas máquinas não têm correspondido às expectativas, e têm apresentado bastantes problemas, até ao nível da própria construção que é demasiado frágil.
Sinceramente, não aconselho para já estas novas máquinas. É preferível continuar com as velhinhas que são de facto extremamente robustas, e pelo menos não nos dão problemas de maior.
No entanto, a maravilha tecnológica das máquinas Braille, é a mountbatten Brailler, uma máquina Braille electrónica.
Esta Máquina, permite uma interacção perfeita entre aluno e professor, mesmo que este não domine o Braille, e obriga o aluno a escrever da mesma forma como numa perkins.
Este equipamento tem de facto inúmeras vantagens.
A primeira, é a função de impressora Braille.
O professor pode trazer para o aluno um texto escrito em Word, liga a mountbatten ao computador, e a máquina é capaz de imprimir esse texto em Braille.
A filosofia desta máquina é muito diferente da perkins.
Aqui existem de grosso modo dois processos: a escrita e a impressão.
Eles podem ser realizados em simultâneo, ou em separado.
Enquanto escreve, a máquina comporta-se como se fosse um computador.
Tem uma voz integrada que permite ouvir o que vamos escrevendo, e dá para manipularmos o texto ao nosso gosto: apagar, acrescentar etc.
Tem uma memória interna capaz de armazenar até 650 páginas, que podem ser consultadas e impressas facilmente.
Quando pretendermos passar para o papel aquilo que escrevermos, basta executarmos um simples comando.
Com um acessório adicional, podemos ligar a mountbatten a um ecrã Lcd, que vai mostrar aquilo que o aluno está a escrever na máquina.
Este equipamento é extraordinário, e resolve muitos dos problemas que advêm da utilização da velha perkins, tais como: O facto de o professor não poder acompanhar em tempo real o trabalho do aluno, o barulho, que incomoda até a própria criança, que não se sente bem em ouvir as queixas dos colegas, e também o facto de não permitir corrigir aquilo que o aluno escreve.
Deixo-vos o endereço para um vídeo armazenado no youtub, onde podem ver uma reportagem sobre esta máquina, que passou no Magazine Consigo da RTp2.
http://www.youtube.com/watch?v=g0CxDW_jfnM
Outra ferramenta muito útil no início escolar de uma criança cega, são as máquinas de impressão de relevos.
Com estas máquinas, pegamos num desenho a tinta, imprimimo-lo ou fotocopiamo-lo num papel térmico apropriado, e a máquina encarrega-se de dar forma ao desenho em relevo, para que a criança cega o possa explorar.
Ainda relacionado com o desenho, deixem-me falar-vos de um sistema curioso chamado Iveo.
O iveo é um sistema composto por um tabuleiro táctil e um software de criação.
Na prática, o professor usa o software para desenhar uma figura, coloca-a no tabuleiro, e grava um registo áudio com a descrição do desenho.
A criança passa o dedo em cima da figura, e ouve a respectiva descrição em áudio.
Vou falar-vos agora do acesso aos computadores e seus periféricos, na perspectiva da criança cega total.
Uma das ferramentas mais importantes, e que infelizmente tem sido negada à maior parte das crianças cegas, são as linhas Braille.
Estes equipamentos, permitem que se possa ler em Braille, a informação que surge no ecrã de um computador.
À uns anos atrás, este tipo de hardware era bastante caro. Hoje, apesar de ainda não ser um produto barato, o seu preço baixou significativamente.
Temos também os sintetizadores de voz. São softwares, que verbalizam em voz sintética a informação que surge no ecrã do computador.
É a solução mais barata, porque tal como sucede com os ampliadores de ecrã, o software apenas usa os recursos da máquina, e não é necessário comprar nenhum hardware específico.
O grande problema de os cegos usarem só os sintetizadores, é que não lêem, só ouvem. E perdendo o contacto físico com a palavra, vão ter uma muito deficiente formação no processo de leitura e escrita.
O ideal é que a criança tenha a possibilidade de usar os sintetizadores de voz, em conjunto com a linha Braille, porque assim continua a poder ler, tal como sucede com os seus colegas.
Um outro periférico essencial para a criança cega são as impressoras Braille.
A filosofia destas máquinas é exactamente igual à das impressoras convencionais. Simplesmente, em vez de imprimir em tinta, ela imprime em Braille.
Esclareço no entanto que os computadores, os sintetizadores de voz, as linhas Braille e as impressoras Braille, são introduzidas já numa fase avançada do percurso escolar da criança.
Daí o facto de ter falado primeiro da Máquina Braille, que é a ferramenta que se usa ainda antes da criança entrar para o primeiro ciclo.
Uma outra vertente que vos queria falar, é a dos manuais escolares.
Infelizmente, nos dias de hoje, mesmo com a tecnologia existente, os alunos com deficiência visual, ainda são altamente discriminados, ao não terem acesso atempadamente aos livros escolares.
Os manuais podem ser impressos em Braille, caracteres ampliados, gravados em áudio, ou em suporte digital.
No entanto, o formato áudio está rapidamente a extinguir-se
em detrimento do digital. De facto com a panóplia de soluções tecnológicas que temos actualmente, os livros em áudio deixam de fazer sentido, porque entre outras coisas não nos permite navegar rápida e confortavelmente pelo texto, e torna o processo de procura muito moroso e nada eficiente.
Os livros, a sua generalidade, são digitalizados através de um vulgar scanner, e de um software de OCR: (reconhecimento ótico de Caracteres).
Depois de o livro estar digitalizado e devidamente corrigido, podemos exportar o documento para Rtf, e a pessoa cega ou amblíope pode lê-lo tranquilamente. Existem milhares de obras digitalizadas nestes moldes, e também diversas bibliotecas que têm o seu próprio acervo de obras em suporte digital, que podem ser requisitadas
pelos deficientes visuais.
No entanto, este processo não é muito usado nos manuais escolares, desde logo porque a digitalização só por si não resolve o problema, visto que é sempre necessário fazer adaptações, porque a digitalização faz-se em texto corrido, e suprime as imagens.
E quando falamos de manuais escolares, temos de colocar textos descritivos das imagens, reformular e descrever os gráficos, tabelas, diagramas, etc.
A maravilha que tem vindo a revolucionar a produção de livros em suporte digital, chama-se Daisy (Digital Accessible Information System), que em Português quer dizer: sistema digital de informação acessível.
Daisy é o nome de um consórcio constituído em Maio de 1996, por algumas bibliotecas produtoras de livros em áudio, para se incrementar a produção digital de livros, surgindo assim os chamados "Digital Talking Books"
(Livros Digitais Falados).
Este padrão, permite-nos conjugar ao mesmo tempo o Braille, os caracteres ampliados, e o áudio.
Num livro produzido no formato Daisy, podemos:
Lêlo numa linha Braille, ouvi-lo no computador através do software leitor de ecrã, e também, é possível ouvir o livro num vulgar reprodutor de música, como por exemplo: leitores de cds compatíveis com mp3, Ipodes, etc.
Mas o formato Daisy apresenta-nos outras possibilidades absolutamente extraordinárias:
O texto escrito aparece no ecrã ao mesmo tempo que é lido, o que facilita a leitura para pessoas com baixa-visão ou dislexia;
A cor e o tamanho do texto podem ser escolhidos à vontade pelo leitor;
a velocidade de leitura pode ser acelerada ou retardada, sem modificar o timbre da voz;
pode pesquisar o índice e saltar directamente para um capítulo;
pode colocar marcadores e anotações ao longo do texto;
pode procurar texto livremente, e iniciar a leitura a partir desse ponto
e pode soletrar Palavras ou Frases.
Vou agora falar da produção de livros Daisy.
Não pretendo deter-me muito neste item, porque a produção de livros envolve várias fases, e é impossível explicá-las em tão pouco tempo. Vou apenas referir a forma mais fácil, para quem desejar começar a experimentar, saber por onde começar.
Então, vamos usar um software de criação de livros Daisy, por exemplo: o dolphin Producer.
Este programa, pega num texto em Word, cria o áudio em voz sintética, sincroniza-o com o texto e cria o CD pronto a ser copiado. É tão simples como carregar num botão.
Por paradoxal que pareça, este programa, é inacessível a deficientes visuais, mesmo apesar de ser fabricado por uma empresa que também produz leitores e ampliadores de ecrã!
Naturalmente que se ao invés de usarmos voz sintetizada, pretendermos utilizar voz humana, teremos de produzir em separado o áudio e só depois sincronizar com o texto. Nesta vertente porém, talvez valha apena aprofundar mais os seus conhecimentos, podendo para isso consultar o site oficial do consórcio Daisy, através do endereço:
http://www.daisy.org
Falo agora de algo bem mais ligeiro, que são os Jogos para Computador.
Este é um tema muito interessante, e desperta sempre uma grande curiosidade.
É muito habitual ouvir a seguinte questão:
Os deficientes visuais podem jogar computador?
A resposta, é positiva. Efectivamente, já existem vários jogos que são acessíveis.
Em minha opinião, é muito importante introduzir os jogos na educação e no lazer da Criança deficiente visual, porque vão ajudar bastante a estimulá-la, e sobre tudo a integrá-la ainda mais, porque hoje para uma criança com visão normal, jogar no computador é a coisa mais natural do mundo.
O sistema DOSVOX, dispõe de alguns jogos que visam não somente o entretenimento, mas também facilitar a aprendizagem, na medida em que, ao jogar, a pessoa está ao mesmo tempo a aperfeiçoar a sua interacção por meio do teclado e com o sistema de um modo geral.
Para além destes jogos serem totalmente acessíveis a pessoas cegas e amblíopes, eles estão cheios de efeitos sonoros, o que faz com que também possam ser jogados com prazer e entusiasmo por pessoas que não têm problemas de visão.
Alguns jogos do sistema dosvox:
Jogo da forca;
Jogo da tabuada;
Jogo de sueca;
Jogo da memória;
Jogo de Mistura de sons;
Paciência;
Jogo do casino;
Jogo da senha, e outros.
Nota importante:
Ao instalar o Dosvox, aperceber-se-á que o sistema contempla outras funcionalidades para além dos jogos.
No entanto, recomendo vivamente que as ignore, e que use o Dosvox apenas para os jogos.
Isto porque, o Dosvox é um sistema fechado, com as suas próprias aplicações, e o objectivo é que a criança seja ensinada a trabalhar com os programas comuns, que todos os outros utilizadores usam no dia-a-dia.
Para quê usar um editor de texto do Dosvox, quando podemos usar o Word, que toda a gente conhece e utiliza?
Para quê usar o navegador de Internet do Dosvox, se podemos usar o Internet Explorer ou o Mozila FireFox, que são ambos universais?
O site oficial do Dosvox é:
http://intervox.nce.ufrj.br/dosvox/
Deixo agora um link para um vídeo no youtubb, que faz uma demonstração do jogo da forca.
http://www.youtube.com/watch?v=-SRF8hZJOfc
Mas existem muitas outras fontes, onde podemos aceder a jogos acessíveis.
Um outro jogo muito popular é o Top Speed 2.
Trata-se de um jogo que simula corridas de automóveis e que está traduzido em Português.
O site deste jogo é:
http:// www.playinginthedark.net
Saliento ainda o hattrick, obrigatório para quem gosta de Futebol.
É um jogo de estratégia, o jogador é treinador de uma equipa de futebol, vende, contrata jogadores, assume todas as responsabilidades na gestão da equipa, e participa num campeonato, onde podem entrar os seus amigos e colegas que também podem assumir o papel de treinadores de outras equipas, fazendo assim uma competição salutar entre eles.
O site deste jogo é:
http://www.hattrick.org
Outras páginas com jogos acessíveis a pessoas cegas e amblíopes:

http://www.audiogames.net
Site em língua inglesa, mas com toda a informação útil para principiantes.
http://www.ogame.com.pt
Aqui poderá fazer o download do jogo universo 22, um excelente jogo de estratégia, em que milhões de utilizadores competem em simultâneo.
http://www.tribalwars.com.pt
http://www.battleknight.com.pt
http://www.metaldamage.com.pt
http://www.bitefight.com.pt
http://www.vendetta.com.pt
http://www.audiogamesbrasil.com
http://www.bscgames.com
http://www.bscgames.com
http://www.kitchensinc.net
http://www.lighttechinteractive.com
http://www.l-works.net
http://www.gmagames.com
http://www.pb-games.com
http://www.vipgameszone.com
http://www.espsoftworks.com
Finalmente, recomendo ainda uma outra página com vários jogos online de aprendizagem do Braille.
É o site Braillebug, que pertence à Fundação Americana de Cegos, e que para além dos já citados jogos com o código Braille, disponibiliza ainda um conjunto vasto de informação sobre este que é o único meio de leitura e escrita para pessoas cegas.
O endereço do site é:
http://www.afb.org/braillebug
Voltando a falar de coisas mais sérias, tenho de dizer que apesar de toda esta evolução tecnológica que se tem verificado, nem tudo é um mar de rosas.
Infelizmente, é com muito desagrado que digo que os casos de infoexclusão que afectam as pessoas com deficiência visual ainda são em grande número.
Falando de Crianças cegas e amblíopes, temos o caso flagrante do Magalhães, que tenho de dizer, não oferece nem de longe nem de perto, a acessibilidade que seria exigida por direito próprio, isto apesar de já em Março de 2009, o secretário de estado Valter Lemos, ter afirmado publicamente que os deficientes iam ter uma versão adaptada do Magalhães.
Numa fase posterior a esta declaração, houveram negociações entre o INESC (Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores) e uma empresa ligada à comercialização de produtos de apoio, negociações essas que visavam a criação de 3 aplicações:
O quero ver, quero ler e quero comunicar. Infelizmente tudo foi inconclusivo, não se chegando a concretizar nada de palpável.
É verdade que existe no mercado uma aplicação chamada Guid,que é fabricada pela empresa Dolphin, mas no meu ponto de vista trata-se de um sistema muito fechado, nada inclusivo, e que apenas facilita um pouco a interacção com o Windows, mas não numa perspectiva integradora como seria desejável, mas cria um conceito novo perfeitamente dispensável.
O que se pretende é que a acessibilidade seja apanágio das aplicações comummente usadas pela generalidade dos utilizadores.
Sinceramente desaconcelho a utilização do Guid.
Os principais problemas de acessibilidade que apresenta o Magalhães são:
Desde logo o software caixa mágica, que é uma das grandes atracções do produto, corre em Linux, e nesta distribuição em concreto, não existe qualquer acessibilidade.
Mas o mais grave, é o facto de nem no próprio Windows, a aplicação Magic desktop, que facilita a utilização às crianças normovisuais, também não estar acessível.
Os jogos que correm em windows a mesma coisa. A diciopédia da Porto Editora, que foi escolhida e transformada na principal ferramenta de estudo, também é completamente inacessível. Restam as aplicações corriqueiras do windows Xp, e do pacote office.
Porque vejamos:
Pegando no Magalhães, e retirando-lhe os jogos, a diciopédia, o Magic Desktop, em suma, toda aquela componente lúdica e educativa adaptada às crianças, o que fica?
O que fica é um computador vulgaríssimo, com o Windows Xp, o Office 2007, o antivírus, o Internet explorer, o windows live mail etc.
Por isso, mesmo correndo o risco de ser eventualmente polémico, tenho de dizer que mais valia que o ministério não desse computadores Magalhães às crianças deficientes visuais, pelo menos enquanto ele estivesse como está, mas em vez disso, facilitasse a aquisição de um outro computador, que fosse igualmente ultraportátil, mas que oferecesse condições mais favoráveis ao nível do hardware.
Por exemplo: A qualidade de som do Magalhães deixa muito a desejar, mesmo com auscultadores. Então, para os cegos, seria muito mais benéfico utilizarem uma máquina que lhes permitisse ter mais conforto na audição do sintetizador de voz.
Outro exemplo: A autonomia da bateria do Magalhães, que já de si é bastante reduzida, perde ainda mais com a utilização do leitor e ou ampliador de ecrã
Por esse facto, e de certa forma para compensar, penso que seria bem mais vantajoso apostar num computador com mais autonomia.
Como todos sabemos, o que não falta no Mercado, são soluções que venham de encontro àquilo que ora defendo.
Admito que muito boa gente ache esta solução demasiado facilitista, e que defendam que o estado tem de garantir que todas as aplicações contidas no Magalhães têm de estar adaptadas a todos.
Obviamente, concordo com essa ideia, mas pela experiência que tenho, e falando no caso da deficiência visual, à que ter a lucidez para reconhecer que as coisas não são assim tão lineares, e a adaptação não é assim tão simples.
Ainda não temos uma distribuição em Linux que seja capaz de correr o caixa mágica, os jogos têm uma forte componente gráfica e interactiva, que não é fácil torná-la acessível aos leitores de ecrã, e outros entraves que no meu ponto de vista são difíceis de transpor, tecnicamente falando.
Antes de terminar esta parte dedicada à info exclusão, permitam-me deixar duas notas importantes.
A primeira não é técnica, mas tem haver com a atitude demonstrada pelo poder político.
É que apesar de eu reconhecer que a adaptação total do Magalhães, nas condições actuais é extremamente difícil, não posso aceitar que um Secretário de estado venha dizer que vai tornar o computador acessível a pessoas com deficiência, e dois anos volvidos, tudo esteja na mesma, e não tenha sido dada qualquer justificação.
Não podemos ter um discurso para a comunicação social difundir, e deixar que os problemas fiquem sem resolução.
A segunda nota, é sobre algumas das aplicações presentes no Magalhães, que não são acessíveis, por manifesta má vontade dos fabricantes.
Um exemplo paradigmático, é a Diciopédia da Porto Editora.
Tecnicamente, tornar este produto acessível é perfeitamente possível, viável, e até simples.
O mesmo se passa aliás com todos os restantes produtos electrónicos da Porto Editora.
Creio que o Estado, o mínimo que deveria fazer, era retirar do Magalhães todas as aplicações que não fossem acessíveis, e em que tecnicamente fosse possível colmatar essas falhas de acessibilidade, substituíndu-as por outras aplicações que cumprissem as normas de acessibilidade.
A ideia, era instalar esses novos programas nos computadores das crianças com deficiência visual. Assim é que o governo faria tudo o que estava ao seu alcance para democratizar o acesso ao computador.
É revoltante percebermos que muitas vezes os produtos só não oferecem acessibilidade por pura má vontade. Nem sequer se pode dizer que seja por falta de conhecimento, porque nós, dirigentes associativos, fartamo-nos de alertar quem de direito, dando sugestões para melhorar a acessibilidade dos produtos, que com grande mágoa o digo, a maior parte das vezes caiem em saco roto.
Eu sei que infelizmente ainda temos condicionalismos de ordem técnica que não se ultrapassam com facilidade. Mas aquilo que nós devemos exigir é que sempre que tecnicamente seja possível, todos os produtos e serviços devem estar acessíveis a todos.
É o chamado desenho universal, do qual eu sou um fervoroso entusiasta, e que me faz sonhar com o dia em que cada um de nós, independentemente da sua limitação física e sensorial, possa utilizar os mesmos recursos, que são utilizados por todos os outros concidadãos.
Isto sim, é que é a verdadeira Democracia no acesso à sociedade da Informação e do conhecimento.

Filipe Azevedo
Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva, 31 de Maio de 2011.