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Lutando pela Igualdade

por Manfas Petrónio

Lutando pela Igualdade

Sérgio Miguel dos Santos é um vencedor. Aos dois anos de idade perdeu a visão e foi
submetido a uma operação que não resultou. Há onze anos foi estudar em Portugal onde
se formou em sociologia. Hoje, sem o apoio de terceiros, ajuda outros portadores
de defi ciência visual.
Quando o assunto é deficientes visuais, a ideia que vem à cabeça das pessoas é a
de indivíduos de mãos estendidas para as pessoas que passam ao longo das avenidas,
ou mesmo parados nos semáforos pedindo esmola. Mas Dos Santos é o exemplo de uma
pessoa que não deixou que a cegueira limitasse os seus horizontes.
Licenciado em sociologia, ele dedica-se à luta pela igualdade em prol dos seus pares
no nosso país. É especialista em educação pública, advocacia e lobbies, e ainda tem
tempo para se entregar, de corpo e alma, à Associação dos Cegos e Amblíopes de Moçambique
(ACAMO), onde é o responsável pela área de informática e advocacia.
“Os cegos deviam ter facilidades de integração e inclusão na sociedade, bem como
a igualdade de oportunidades no mercado de emprego”, diz. Mas a sua vida não se resume
apenas a isso, aliás, ainda há muito por contar.
Dos Santos passa o tempo a ensinar outros indivíduos que também têm problemas visuais.
Alguns deles já sabem digitar e produzir documentos num computador, graças ao seu
empenho e dedicação.
Mora a um pouco mais de 500 metros da associação. O trajecto de casa ao seu local
de trabalho faz a pé e sem ajuda. A sua rotina diária é sempre a mesma. Quando chega
ao seu escritório, começa por verificar e responder aos e-mails. Depois lê os jornais
internacionais e a partir das 8 horas dedica-se à capacitação dos seus companheiros,
actividade que se prolonga até perto das 15 horas.
Graças a um sintetizador de som de que as máquinas dispõem, Dos Santos consegue comunicar-se
por e-mail e obter informações através dos jornais. “Todos os computadores são acessíveis
aos cegos”, comenta.
Numa agremiação com cerca de 15000 membros inscritos em todo o país e 350 na cidade
de Maputo, Dos Santos contribui na capacitação de outros membros em matéria de advocacia
e lobbies, saúde ocular que consiste na sensibilização das comunidades sobre os cuidados
a tomar para prevenir a cegueira, e promove também palestras sobre os métodos de
prevenção do HIV.
Não constam nas estatísticas
Não estão nas estatísticas oficiais do país. Ou seja, não existem informações fiáveis
sobre o número exacto de cegos em Moçambique. Mas, dados da OMS dão conta de que
5 porcento dos 21 milhões de habitantes no país são cegos.
Criada para defender os interesses dessa camada da população em Março de 1995, a
ACAMO está a estudar, com o Instituto Nacional de Estatística (INE), a possibilidade
de os próximos recenseamentos da população incluírem, de forma exacta, informações
sobre este grupo populacional.
Trabalha na ACAMO desde Março deste ano quando regressou de Portugal onde viveu durante
11 anos como estudante bolseiro. Sérgio dos Santos nasceu em Nampula em 1973 e, depois
de ter passado pela Rússia onde foi operado, estudou no Instituto de Defi cientes
Visuais da Beira.
Com excepção daquela instituição de ensino para defecientes visuais, frequentou também
escolas regulares. De 1994 a 1998, trabalhou numa empresa comercial como telefonista
em Maputo.
ACAMO
Desde 1995 buscando soluções para os defi cientes visuais, a ACAMO é a maior agremiação
do género e está representada em todo o país através de delegações provinciais. Foi
antecedida por duas do mesmo género: a Organização Nacional dos Cegos de Moçambique
(ONACEM) nos anos ‘80 e, mais tarde, pela Associação dos Deficientes de Moçambique,
(ADEMO).
Refira-se que as agremiações que lutam pela defesa dos interesses dos cegos têm a
sua origem na capital da província de Sofala, cidade da Beira. Tal se deve ao facto
de aquela cidade possuir a única escola especializada para deficientes visuais nopaís.
Instituição pioneira na prestação de apoio aos deficientes visuais da antiga colónia portuguesa, foi fundada Em 22 de Julho de 1969 pelo Dr. Assis Milton, conhecido tiflólogo português, para lhes assegurar o acesso à educação e reabilitação profissional.
Há 42 anos que a instituição de ensino, sedeada no Chiveve, funciona como uma escola
primária completa para pessoas com problemas visuais. Hoje, tem capacidade para acolher
cerca de 80 alunos num universo de 2000 que existem naquela província.
Em termos pedagógicos, obedece ao Sistema Nacional de Ensino preconizado pelo Ministério da Educação. No que toca à assistência social, depende do Ministério da Mulher e
Acção Social.
Dificuldades
Mesmo desenvolvendo a audição e o tacto de maneira diferente, os deficientes visuais
deparam-se com dificuldades que não são superadas por esses sentidos.
No caso de Dos Santos, a sua luta é vencer os obstáculos espalhados, diga-se, por
todo país: os passeios esburacados e a falta de sinais de trânsito específicos.
Os semáforos e as passadeiras foram concebidos sem se tomar em conta as necessidades
dos defi cientes visuais. “Há dias, fiquei à beira da estrada sem saber como atravessar,
até chegar um senhor que me ajudou a passar”, conta indignado.
E ressalta o que se deveria melhorar a cidade para que o deficiente visual pudesse
ter uma vida com menos dificuldades: “Eu tenho em mente o mapa da cidade. Sei como
chegar aos locais, mas para quem ainda não conseguiu mentalizar isto, fica difícil.
Por isso, os autocarros públicos e não só deviam ter um sistema sonoro automático
que diz o destino”.
Outro problema tem a ver com a bengala. “Parece que os condutores não percebem o
significado dela. Passam por nós sem respeito, mesmo quando estamos identifi cados
como cegos. É um milagre chegar bem a casa depois de percorrer as nossas estradas.
Todos os dias tenho o receio de ser atropelado”, comenta.
A padronização dos passeios também resolveria os problemas. Noutros países, por exemplo,
nos pontos de autocarros, há uma caderneta escrita em Braile e em tinta ampliada.
Assim, os cegos identifi cam as linhas e os números dos veículos. “Se estou na estátua
e quero chegar ao Museu vou saber a linha e o número”, diz.
Tendo a tinta, o número fica na mão, mostra-se ao motorista e se não for o carro
que se pretende seguir ele não vai precisar de parar. “Esse serviço poderia ser implantado,
uma vez que não só beneficia os cegos mas também os idosos e outras pessoas que não
sabem ler, mas precisam de ver a sua vida facilitada”, termina Dos Santos.

Comentários

Olá !

Esses cegos q andam a pedir esmolas, dão uma má imagem dos cegos, e são uns preguiçosos de primeira, não querem fazer nada !

Mas felizmente muitos cegos têm um emprego digno, uma vida digna, bastante preenchida ... !
Portanto, generalizar é e será um grande erro !

Abraços