Prezados,
Venho partilhar com vocês este belo resumo sobre a colocação pronominal, com o objetivo de contribuir para uma áudio-descrição de qualidade, assim na técnica tradutória, como na forma de a apresentar no vernáculo.
A áudio-descrição, como sabemos, é uma forma de tradução, não lingual, porém, visual. O termo áudio-descrição foi cunhado por Gregory Frazier em meados da década de setenta e, já ao conceber esse termo, o mestre reconhecia que o mister dessa tradução era uma arte. Sim, ele entendia a áudio-descrição como uma arte; como a tradução de eventos visuais em palavras.
Desde Frazier, a áudio-descrição cresceu, foi melhor compreendida e passou a ser aplicada a distintos eventos, como os dinâmicos e estáticos.
Hoje, não falamos de áudio-descrição como uma mera descrição, só que em áudio, falada, veiculada por algum aparelho FM ou Bluetooth, mesmo porque não era disso que Frazier tratava ao considerar a áudio-descrição uma arte, a arte de traduzir eventos visuais em palavras.
Com efeito, ele, inicialmente, pensava a áudio-descrição como uma tradução do visual em suporte com a escrita Braille.
A similaridade entre a áudio-descrição e a descrição, contudo, pode levar o menos estudado a achar que de uma imagem estática não se faz tradução visual, não se faz áudio-descrição, quando esta não é veiculada em áudio. Obviamente, a áudio-descrição não é definida pelo suporte que é veiculado, mas, pelas técnicas tradutórias de que faz uso. E, por isso, conhecer o vernáculo é indispensável para uma áudio-descrição de qualidade.
Devido às dificuldades da língua portuguesa e, mais vergonhosamente, por falta de estudo dos formadores e tradutores visuais, temos visto áudio-descrições deploráveis, verdadeiros acintes ao idioma e aos usuários da áudio-descrição.
Como sou eu formador de áudio-descritores e, portanto, responsável pela qualidade das traduções que meus alunos fazem, busco sempre estudar as técnicas de tradução visual e as regras que regem nosso idioma. Infelizmente, isso não impede de eu cometer erros, por vezes grosseiros contra nossa língua mãe. Todavia, se os cometo, mais é por outra causa que por falta de estudo, coisa que vejo ocorrer com outros formadores e áudio-descritores, os quais parecem gostar de “desconhecer”, uma vez que se “recusam” a estudar ou aplicar os estudos que receberam.
Ao preparar-me para mais um curso de áudio-descrição, revisitei a obra do grande Said Ali “Dificuldades da Língua Portuguesa”, de onde tiro o resumo que abaixo Segue.
A obra completa desse importante autor pode ser baixada gratuitamente em: http://www.academia.org.br/abl/media/Dificuldades%20da%20Lingua%20Portug...
Espero que possam fazer bons uso deste resumo e melhor uso ainda da obra completa.
Cordialmente,
Francisco Lima
Para terminar o presente estudo, podemos resumir em poucas palavras
as conclusões a que no levaram os fatos observados:
Na linguagem corrente de Portugal, os pronomes pessoais complementos
colocam-se normalmente depois do verbo; podem, no entanto,
deslocar-se. Essa deslocação efetua-se em virtude de uma lei
fonética, a saber: quando não há pausa depois da palavra que precede
o verbo, o pronome átono passa a interpor-se, ou seja, para amparar o
primeiro vocábulo se tiver pronúncia fraca, ou para fazê-lo sobressair
enfaticamente se tiver entonação própria. As exceções aparentes são
devidas à interferência de outras leis.
_ Dificuldades da Língua Portuguesa 59
Assim é que no infinitivo não flexionado o conceito do substantivamento
pode neutralizar a ação atrativa de vocábulos átonos, como a
preposição e o advérbio negativo.
Com os elementos fornecidos pela fonética, pode a sintaxe dar esta
regra de anteposição do pronome, segundo o falar lusitano, tratando-
se de orações de verbo finito: o pronome átono antepõe-se ao verbo
nas frases negativas, nas interrogativas que comecem por pronome
de interrogação ou partícula interrogativa, e nas subordinativas (com
algumas exceções).
Acrescente-se ainda que o discurso não deve começar por pronome
átono, que nas formas do futuro a posposição é substituída pela (aparente)
interposição, e que nos chamados tempos compostos o pronome
é enclítico do auxiliar e não do particípio passado.
No Brasil observa-se, como em Portugal, a construção quanto aos
tempos compostos e quanto ao futuro (do presente e do pretérito), e,
na linguagem literária, não se começa o discurso pelo pronome complemento.
Outro tanto não se dá com a regra de anteposição há pouco
formulada, que pressupõe pronúncia lusitana nos pronomes, nas partículas
e na frase em geral. As condições de pronúncia são outras no
Brasil; logo essa regularidade não pode existir. A regularidade lusitana
é correta em Portugal; a liberdade de colocação é correta no Brasil,
conforme já está sancionada na linguagem literária pelos escritores
brasileiros. Ocioso seria querer um povo imitar o outro; e tanto custa
ao brasileiro imitar o português, quanto é difícil a este o acompanhar-
nos a nós. O que num país parece brotar espontâneo ao ar livre,
noutro só se conseguiria a poder de cultura em atmosfera artificial.
M. Said Ali
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