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Opinando - Blog de Filipe Azevedo - blog de Filipecanelas

Tarifa dois por um da Cp - publicação de uma troca de mensagens, entre mim e a empresa

por Filipecanelas

Caros Leitores.
Relacionado com a Tarifa dois por um, e com uma alegada norma interna, ao que parece altamente misteriosa que nem sequer é revelada ao público, norma essa que, segundo os responsáveis da CP impede que duas pessoas com a mesma deficiência possam viajar usando a tarifa supra citada, troquei duas mensagens com o serviço de Reclamações da Cp., expondo um caso particular, e que naturalmente pode ser transportado para centenas de outros casos em tudo idênticos.
São 3 mensagens.
A primeira, que contém a reclamação propriamente dita, A segunda, que é a resposta da CP, e finalmente a terceira, que é digamos assim a minha contra resposta.
A esta terceira mensagem, até ao momento ainda não obtive resposta por parte da empresa.
Creio que seria positivo se todos os clientes que já foram importunados por causa da tal norma interna, se queixassem por escrito junto da CP. Ou no site, ou nos balcões de apoio ao cliente, por fax, por carta, ou preenchendo o livro de reclamações.
Para já, partilho convosco a sequência das 3 mensagens em causa.
Primeira mensagem. Enviada por Filipe Azevedo, no dia 18 de Julho de 2010.
Sou um cliente da Cp com necessidades especiais, visto que sou cego congénito.
Vivo com a minha companheira, que é praticamente cega, tendo apenas cerca de 5 % de resíduo visual.
Ambos somos funcionários públicos, e viajamos amiúdas vezes de comboio.
Sucede que, até agora temos optado por viajar utilizando a tarifa dois por um. Como as viagens que fazemos são quase todas para a terra da minha companheira, e antes de ela viver comigo, fez aquele percurso sozinha centenas de vezes, entendo que ela tem todas as condições técnicas para me acompanhar. Está familiarizada com o trajecto, sabe a onde temos de desembarcar, conhece perfeitamente a estação em causa, e nunca me senti inseguro, ainda para mais tendo ela um resquício de visão, que neste caso dá imenso jeito, para identificar por exemplo as passadeiras.
O que me levou a escrever esta mensagem é o facto de vários revisores terem colocado entraves ao facto de viajarmos utilizando a tarifa dois por um.
Os argumentos utilizados pelos senhores revisores, são, desculpe-me a sinceridade incongruentes e altamente preconceituosos, demonstrando que nada entendem da cegueira.
Eles afirmam ipsis-verbis que um cego não pode acompanhar outro cego. Como V.Exa sabe, existem cegos que não estão reabilitados e que não conseguem dar um passo sozinhos porque não usam bengala, e por outro lado existem outros perfeitamente reabilitados, que são capazes de se deslocarem para qualquer sítio que conheçam.
Temos naturalmente os que ficam a meio termo, em fim, cada pessoa é um caso diferente.
Então, eu pergunto. Se há cegos que utilizam adequadamente a bengala, conhecem bem o caminho que vão fazer, a onde está o problema de acompanhar outra pessoa cega?
Se o objectivo inicial da Cp, foi a de minorar as dificuldades que sentem as pessoas com mobilidade reduzida, e para tal concedem a esses concidadãos a possibilidade de escolherem um acompanhante, creio que é naturalíssimo que uma pessoa cega possa ter a possibilidade de escolher quem quiser, desde que assuma essa responsabilidade, e não peça ajuda à Cp.
No meu caso é caricato que tendo eu uma companheira cega não possa usufruir da tarifa dois por um, e se tivesse uma companheira que visse, já podia beneficiar. Mas eu que sou perfeitamente consciente, e que confio na minha companheira, que sei que ela é capaz de me ajudar a deslocar[-me porque aquilo que eu preciso é apenas que ela me indique o caminho, visto que eu domino as técnicas da bengala, sinto-me discriminado, e várias vezes tenho travado diálogos e argumentos com os senhores revisores, que no meu ponto de vista estão a agir com claro preconceito em relação aos cegos, fazendo crer que nós somos incapazes.
Eu sou responsável pelas minhas decisões, repito, o que não posso é usufruir da tarifa dois por um, e depois pedir ajuda à CP. Isso eu sei que não posso fazer, mas o resto penso que é da minha inteira responsabilidade.
Até porque, temos aqui uma questão técnica. Se para eu comprar o bilhete dois em um, tenho de apresentar a minha certidão multiusos, como é que o senhor revisor, atesta a deficiência da minha companheira, apenas com o olhar, e usando apenas a sua sensibilidade? Para uns casos é preciso documentação, para outros não e necessário?
Alguns Senhores revisores falam ainda de uma norma interna, que não conheço, e eles próprios também não me a mostram porque como se trata de um documento interno, não pode ser mostrado ao público. Se nem sequer a posso conhecer, como é que a posso respeitar e cumprir?
Pelo exposto, venho pedir a V.Exa que se digne esclarecer-me, e resolver este imbróglio que várias vezes me tem embaraçado no com bóio.
Fim.
Segunda mensagem. Enviada por Cp, no dia 27 de Julho de 2010.
Exmo. Senhor José Filipe Azevedo
Recebemos a sua comunicação que mereceu a nossa melhor atenção.
A CP celebrou com o INR (Instituto Nacional para a Reabilitação), um acordo com o objectivo de garantir às pessoas com deficiência viajar nos comboios com maior autonomia. Desta forma foi criada a Tarifa 2/1 que permite à pessoa com deficiência viajar com um acompanhante que usufrui de bilhete gratuito ao abrigo desta Tarifa.
O direito ao acompanhante pressupõe que este possa exercer verdadeiramente a sua missão, isto é, ajudar ou orientar o acompanhado (pessoa com deficiência com grau de incapacidade igual, ou superior a 80%) na entrada ou saída das estações e dos comboios, bem como durante a viagem e, por consequência, não deter incapacidade que iniba ou dificulte tal função.
Neste contexto, não pode ser considerado acompanhante de deficiente, logo, usufruir de bilhete gratuito ao abrigo da Tarifa 2/1, o cliente que seja também portador de deficiência igual à pessoa com quem viaja.
Mais informamos que a regulamentação interna da CP pode ser consultada, a pedido, numa estação ou Gabinete de Apoio ao Cliente que prestem serviço de Longo Curso.

Melhores cumprimentos
fim.
Terceira Mensagem. Enviada por Filipe Azevedo, no dia 28 de Julho de 2010.
Prezados Srs.
Na sequência do pedido de esclarecimento que fiz no passado dia 18 de Julho de 2010, registado pelos vossos serviços com o n. MCC-2010-00774, em que vossas excelências tiveram a amabilidade de me responder no dia 27 de Julho de 2010 às 12 e 34 H, gostaria de recolocar algumas questões que me parecem importantes, em nome do mais elementar bom senso e inteligência.
1. Afirmam V.Exas que “não pode ser considerado acompanhante de deficiente, logo, usufruir de bilhete gratuito ao abrigo da Tarifa 2/1, o cliente que seja também portador de deficiência igual à pessoa com quem viaja.
Poderei então viajar com uma pessoa tetraplégica? Desculpem a eventual ironia nesta questão, mas quem como eu lê uma afirmação destas não pode deixar de sorrir, porque efectivamente se quisermos fazer uma interpretação literal do que alegadamente refere a tal norma interna, este problema que ora coloco, não me parece assim tão descabido.
Gostava de conhecer o texto integral dessa norma, para o poder ler, e assim o conhecer amplamente, por forma a perceber a ideia de quem a criou. Porque já vimos que o mesmo aparentemente é demasiado preconceituoso, e legalmente ambíguo.
2. Como é que os clientes da Cp. vão conhecer essa norma interna se V.Exas não a disponibilizam ao público?
Imaginem que um amigo meu deficiente visual, é multado no comboio por estar a usufruir da tarifa dois por um. Como sabem nenhum português pode evocar desconhecimento da lei. Mas neste caso não estamos a falar de uma lei, mas sim de uma norma interna. A informação que está disponibilizada publicamente, é que um deficiente visual pode viajar acompanhado por uma pessoa, beneficiando o acompanhante de bilhete gratuito. A informação prestada ao público não diz absolutamente mais nada.
Entretanto, alguém lembrou-se de criar uma norma interna, misteriosa, que ninguém conhece, mas que diz que uma pessoa não pode ser acompanhada por alguém com a mesma deficiência.
Como é que alguém vai conhecer uma norma interna, se ela nunca lhe chegou às mãos, nem está disponibilizada publicamente? Não acham V.Exas caricato?
Mas, se o cliente vai à sua vida, não pede ajuda à Cp., confia no acompanhante, em que é que a Cp. sai prejudicada? Na pior das hipóteses, as duas pessoas com deficiência, poderiam abordar dois clientes sem deficiência, pedindo-lhes para que eles comunicassem ao Senhor Revisor que estavam a acompanhar as pessoas com deficiência.
Naturalmente não concordo com este tipo de posturas, porque a melhor lei é a do bom senso, E isso é coisa que desculpem a sinceridade, alguns senhores revisores não têm tido, nem quem fez a tal norma também não teve. Porque a pessoa é que sabe se confia no acompanhante ou não, os Senhores Revisores da Cp. não são nem oftalmologistas, nem técnicos de mobilidade nem delegados de saúde. São aliás estes últimos que atribuem aos deficientes o respectivo grau de incapacidade. Por tanto em nenhuma circunstância, os funcionários da Cp. têm competência para atribuírem o que quer que seja, a este respeito.
3. Não será que estão a colocar problemas a onde eles não existem?
Obviamente, se um deficiente for acompanhado, e mesmo assim for à Cp. pedir ajuda para embarcar e desembarcar no comboio, a Cp. tinha toda a razão para multar a pessoa que está a abusar do bom senso e da lei. Agora se um deficiente vai com o seu acompanhante tranquilamente e não pede ajuda a ninguém, a onde está o problema?

Certo da melhor receptividade, subscrevo-me com a mais elevada estima e consideração.

Filipe Azevedo.

Comentários

Bom Filipe o que lhe aconteceu é sem dúvida caricato. Não entendo porque é que as pessoas só complicam o que não é complicado. Dou-lhe todo o meu apoio para continuar a lutar e sinceramente espero que essa instituição resolva o problema. Infelizmente os prevconceitos contra nós ainda são muitos mas se cada um for lutando as coisas vão-se resolvendo digo eu na minha humilde opinião.

Prezada Cláudia.
Muito obrigado pelo seu apoio. São acertadíssimas as suas palavras. O preconceito infelizmente está ainda muito enraizado na cabeça de muita gente. E quando temos o azar de essas pessoas terem algum poder que de certa forma vai mexer com a nossa vida, então aí a desgraça é total!
Tenho mesmo para mim que a vida para os deficientes não está nada fácil, e que provavelmente seremos um grupo que a médio longo prazo, vamos sentir na pele muita descriminação.
Um abraço.
Filipe.

+Filipe Azevedo

No passado dia 14 fui mais uma vez informado por uma funcionária da CP de Braga de que não podia ser acompanhado por uma pessoa cega. Entretanto ´devo dizer que foi muito simpática e até me disse que se eu viesse comprar o bilhete sozinho que mo vendia porque aí seria eu e não ela que assumiria a responsabilidade do acompanhante que levava. Devo confessar que concordei, pois creio que a lei não obriga ninguém a levar o acompanhante para comprar o bilhete.
Entretanto gostava de saber se alguém já tem acesso à famosa norma interna.?
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